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MP abre investigação contra prefeito de Natal que distribuiu ivermectina contra a Covid-19

Álvaro Dias (PSDB) é acusado de infringir determinação do poder públic, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa e fornecer substância em desacordo com receita médica

Conselho Federal de Farmacêuticos reforça que não há evidência significativa de eficácia da Ivermectina em pacientes com a covid-19.
Conselho Federal de Farmacêuticos reforça que não há evidência significativa de eficácia da Ivermectina em pacientes com a covid-19. -
O Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) abriu uma investigação contra o prefeito de Natal, Álvaro Dias (PSDB), pela distribuição de ivermectina como tratamento preventivo contra a covid-19, após o recebimento de pelo menos três denúncias sobre tal prática. O processo, que tramita em sigilo judicial investiga, segundo fontes do Estadão com acesso aos documentos, a prática dos crimes dispostos nos Artigos 268 e 280 do Código Penal que são, respectivamente, "infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa" e "fornecer substância medicinal em desacordo com receita médica".

"Com relação ao uso profilático da ivermectina, já há, no âmbito desta CJUD (Coordenadoria Jurídico Judicial), Notícia de Fato em andamento, a fim de apurar a possível prática dos crimes previstos nos artigos 268 e 280 do Código Penal, pelo Prefeito de Natal/RN, Álvaro Costa Dias, em decorrência da propagação do uso da Ivermectina como meio substitutivo ao uso da vacina para imunização coletiva. No entanto, como a noticiante informa que tal prática pode configurar também possível ato de improbidade administrativa praticado pelo Prefeito, necessário o encaminhamento da referida representação à Coordenação das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Natal, para fins de conhecimento e adoção das medidas que entender pertinentes no âmbito cível", escreveu em Despacho a uma das autoras da denúncia apresentada ao MPRN, o promotor Flávio Sérgio de Souza Pontes Filho, coordenador Jurídico Judicial da Procuradoria Geral de Justiça do Rio Grande do Norte (PGJ-RN).

Ineficácia

Álvaro Dias é um defensor do uso da ivermectina, medicação cujos estudos mostraram ineficácia na prevenção ou tratamento contra a covid-19, desde meados do ano passado. No Decreto Nº 7.044 de 8 de julho de 2020, Dias determinou que a Secretaria Municipal de Saúde de Natal (SMS Natal) providenciasse a disponibilização de "kit de medicamentos aos pacientes infectados pela covid-19 que possuam receita médica com a indicação de tratamento com tais fármacos como hidroxicloroquina, cloroquina, ivermectina, azitromicina ou outros fármacos que venham a ser liberados e preconizados pelo Ministério da Saúde".

No portal da prefeitura do Natal, a Assessoria de Comunicação postou, no dia 15 de fevereiro passado, reportagem na qual afirma: "Até que a vacinação em Natal esteja concluída, o prefeito Álvaro Dias pretende reforçar as políticas de prevenção à doença e as voltadas para o tratamento precoce. O uso da Ivermectina, como medicamento profilático, por exemplo, é apontado pelo prefeito como extremamente necessário e benéfico, por evitar a disseminação da doença e ajudar a reduzir a carga viral e, assim, diminuir frontalmente os efeitos da covid-19 nas pessoas". Não foi citado, porém, nenhum estudo científico que comprove o que é defendido pelo prefeito, que é médico pediatra formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

No dia 3 de fevereiro deste ano, a Secretaria Municipal de Administração (Semad Natal) publicou Extrato da Ata de Registros de Preços 001/2021 referente ao Pregão Eletrônico Nº 24.082/2020 na qual detalha, entre outros produtos, o custo para aquisição de 500 mil comprimidos de Ivermectina 6mg, da marca Vitamedic. O documento, com vigência de um ano a partir da publicação ocorrida em Diário Oficial do Município no dia 4 de fevereiro passado, informava o valor total de R$ 350 mil para aquisição da medicação, cujo custo unitário é de R$ 0,70.

Dois dias depois, no Decreto Nº 12.179, Álvaro Dias "recomendava a realização da quimioprofilaxia terapêutica ou preventiva da população, assegurado ao profissional médico a liberdade de prescrição pré-hospitalar dos medicamentos que ele entender como eficazes para tratamento da covid-19".

Colapso hospitalar

A investigação contra o prefeito Álvaro Dias ocorre em meio ao período mais crítico da pandemia em Natal. Na segunda-feira, 15, a Plataforma Regula RN, da Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap) mostrava que 117 pacientes esperavam um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para tratar a covid-19. Desses, 116 estavam na Grande Natal. Em todo o RN, havia somente 8 leitos críticos disponíveis.

Além disso, a ocupação em todo o Estado de leitos de UTI para covid-19 no SUS estava em 95,59% enquanto para leitos clínicos a lotação é de 91,43%, número que vem aumentando nos últimos dias. No Rio Grande do Norte, segundo dados do consórcio de veículos de comunicação, já são 3.959 mortes por covid-19 (sendo 22 óbitos registrados nas últimas 24 horas) e 181.390 casos no total. Além de defender a ivermectina, Álvaro Dias tem se posicionado contra o lockdown.

Em nota, a prefeitura do Natal declara que "adota a quimioprofilaxia no atendimento a pacientes com covid-19 amparada no protocolo médico aprovado tanto pelo Conselho Regional de Medicina, quanto pelo Comitê Científico Municipal, e por considerar os procedimentos como adequados do ponto de vista técnico aos fins a que se propõem, sobretudo visando à prevenção e à contenção de casos graves". A Assessoria de Comunicação do prefeito Álvaro Dias não comentou o processo investigativo aberto pelo MPRN.