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Cristina Buarque, referência no samba, morre aos 74 anos

Moradora ilustre de Paquetá, artista, que era avessa à badalações, ficou conhecida pelo trabalho incansável de garimpar pérolas da música

Por Manuella Viegas

Publicado às 20/04/2025 13:33:11 Atualizado às 20/04/2025 13:33:11
Cantora Cristina Buarque, que morreu aos 74 anos, morava na bucólica Ilha de Paquetá
Rio - A cantora Cristina Buarque morreu aos 74 anos, neste domingo (20). A informação foi confirmada pelo filho da artista, Zeca Ferreira, nas redes sociais. Ela era irmã do compositor Chico Buarque e da cantora Miúcha.
"Uma cantora avessa aos holofotes. Como explicar um negócio desses em qualquer tempo? Mas como explicar isso nesse tempo específico? Mas foi isso a vida inteirinha dessa mulher que tivemos, nós 5, a sorte grande de ter como mãe", iniciou Zeca em um relato emocionante.
"Uma vida inteira de amor pelo ofício e pela boa sombra. 'Bom mesmo é o coro', ela dizia, e viveria mesmo feliz a vida escondidinha no meio das vozes não fosse esse faro tão apurado, o amor por revirar as sombras da música brasileira em busca de pequenas pérolas não tocadas pelo sucesso, porque o sucesso, naqueles e nesses tempos, tem um alcance curto", seguiu.
"É imagem bonita e nítida mas desfoca as outras belezas que se perderiam na sombra não fossem essas pessoas imunes ao imediato. Ser humano mais íntegro que eu já conheci. Farol, chefia, braba, a dona da p*rra toda. Vai em paz, mãe", finalizou.
Trajetória
Nascida em 23 de dezembro de 1950 em São Paulo, Maria Cristina Buarque de Holanda é filha do historiador Sérgio Buarque de Holanda, autor do clássico "Raízes do Brasil". Além de Chico, ela também é irmã das cantoras Miúcha e Ana de Hollanda (ex-ministra da Cultura). Em 1974, ficou nacionalmente conhecida ao gravar a canção "Quantas Lágrimas", de Manaceia, no álbum "Cristina".
Totalmente avessa aos holofotes, levava uma vida longe da fama. Em Paquetá, onde morava, costumava ser vista em roda de samba e choro. A artista, apelidada carinhosamente de "Chefia", era considerada uma verdadeira enciclopédia de música brasileira. Os gatos eram outra paixão, além do cigarro e da cervejinha.
Portelense de coração, ao longo da carreira Cristina, que também era pesquisadora, sempre fez questão de eternizar as obras de grandes nomes do samba, como Noel Rosa, Dona Ivone Lara, Candeia, Wilson Batista, Mauro Duarte e muitos outros. Seus discos, todos fora de catálogo, são disputados em sebos e loja especializadas.
Homenagens
Perfis relacionados ao samba e fãs homenagearam Cristina, na manhã deste domingo (20). O Bip Bip, tradicional bar em Copacabana, muito frequentado pela artista, lamentou a morte da cantora e celebrou seu legado.
"Sacana na medida certa, nao vivia sem um bom papo de botequim. Bebedora de Brahma, moradora de Paqueta, amante dos seus gatos e da familia linda que criou (praticamente dentro do Bip, inclusive). Podemos passar a vida falando dela, da sua importância pro samba, pro nosso bar, pras nossas vidas, e vamos fazer isso sempre. Lembrar com carinho da pessoa que fez tudo começar musicalmente pra gente e pra toda uma geração que - literalmente - bebeu na sua fonte", escreveu.
O músico Tiago Prata, o Pratinha, muito amigo de Cristina, relembrou o último encontro com a cantora. "Dei muita sorte de estar presente ao seu lado em vários momentos. A última vez no final do ano passado, onde dei um jeito de, sorrateiramente, levá-la pro bar pra comemorar seus 74 no lugar que era a cara dela, aquela esquina na Ilha de Paquetá, onde ela se entocou nos últimos anos. Desse dia, saiu um registro lindo dela cantando Cartola".
A cantora Alice Passos lamentou a partida e relembrou a personalidade da artista. "Partiu a enorme Cristina Buarque, cantora, mãe, avó e a pesquisadora mais generosa e menos vaidosa que já conheci na vida. Cristina era completamente avessa a homenagens e me avisou quando quis a homenagear em vida pelos seus 70 anos: “e já vou avisando, não quero homenagens quando morrer!", disse.
 
* Colaborou: Raphael Perucci