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PGR pede ao STF condenação de Bolsonaro e mais sete por golpe de Estado

Manifestação inclui nomes de Alexandre Ramagem, Braga Netto, general Augusto Heleno e outros militares

Por Meia Hora

Publicado em 15/07/2025 11:48:17
Ex-presidente, Jair Bolsonaro (PL)
A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu nesta segunda-feira (14) ao Supremo Tribunal Federal (STF) a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de mais sete réus do "núcleo crucial" da trama golpista.

A manifestação foi enviada ao ministro Alexandre de Moraes, por volta das 23h45, e faz parte das alegações finais, a última fase antes do julgamento dos acusados, que deve ocorrer em setembro deste ano.

No documento, que tem 517 páginas, o procurador-geral, Paulo Gonet, defende que Bolsonaro e os demais réus sejam condenados pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

As penas máximas para os crimes passam de 30 anos de prisão. Além de Bolsonaro, a PGR pediu a condenação dos seguintes réus:

- Walter Braga Netto, general de Exército, ex-ministro e vice de Bolsonaro na chapa das eleições de 2022;
- General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
- Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência - Abin;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito Federal;
- Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
- Paulo Sérgio Nogueira, general do Exército e ex-ministro da Defesa;
- Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
Em caso de condenação, Cid deverá ter a pena suspensa devido ao acordo de delação premiada assinado com a Policia Federal (PF) durante as investigações.

Bolsonaro
Na manifestação, o procurador-geral descreveu o papel do ex-presidente na trama golpista.

Segundo ele, Bolsonaro figura como líder da organização criminosa e foi o "principal articulador e maior beneficiário" das ações para tentar implantar um golpe de Estado no país em 2022.

Nas palavras de Gonet, o ex-presidente instrumentalizou o aparato estatal e operou em "esquema persistente" de ataque às instituições públicas e ao processo sucessório após o resultado das eleições presidenciais.

"Com o apoio de membros do alto escalão do governo e de setores estratégicos das Forças Armadas, mobilizou sistematicamente agentes, recursos e competências estatais, à revelia do interesse público, para propagar narrativas inverídicas, provocar a instabilidade social e defender medidas autoritárias", disse o procurador.

Próximos passos
Com a apresentação da manifestação da PGR, começa a contar o prazo de 15 dias para que a defesa de Mauro Cid, delator na investigação, apresente suas alegações finais ao STF.

Em seguida, será a vez das defesas dos réus apresentarem suas alegações no mesmo prazo. Após receber todas as manifestações, a data do julgamento será marcada pela Primeira Turma da Corte. Nos bastidores do STF, a expectativa é de que o julgamento seja realizado em setembro deste ano.
Veja as provas para pedir condenação de Bolsonaro
- Abin Paralela

"No exercício do cargo mais elevado da República, instrumentalizou o aparato estatal e operou, de forma dolosa, esquema persistente de ataque às instituições públicas e ao processo sucessório", afirmou Gonet citando, por exemplo, as provas obtidas no inquérito da "Abin Paralela".

As investigações mencionadas pela PGR indicam o uso da Agência Brasileira de Inteligência durante o governo Bolsonaro para espionar adversários políticos e agentes públicos considerados infiéis. "A existência dessa estrutura oculta é prova da lógica de aparelhamento institucional implementada pelo réu", escreveu.

- Ataque coordenado às urnas eletrônicas

Em outro trecho do documento enviado ao STF, Gonet menciona a apreensão de documentos pela PF que demonstraram como Bolsonaro e seus aliados planejaram "a propagação coordenada de ataques ao sistema eletrônico de votação".

"Foi fixada, por escrito, a diretriz de repetição contínua da narrativa de vulnerabilidade das urnas eletrônicas, como forma de deflagrar movimentos de rebeldia contra os resultados desfavoráveis ao grupo", apontou o PGR.

Uma das provas desse movimento orquestrado foi "live" realizada por Bolsonaro, no Palácio do Planalto, na qual fez diversos ataques às urnas eletrônicas. Além da transmissão ao vivo, a PGR cita diversas manifestações do ex-presidente e de seus apoiadores nas redes sociais que comprovariam o caráter coordenado da investida contra o sistema eleitoral.

Conversas apreendidas no celular do tenente-coronel Mauro Cid ajudaram a embasar este e outros pontos denunciados pela PGR.

"Comprovou-se, por meio de arquivos físicos e digitais apreendidos (minuciosamente descritos na denúncia), que o conteúdo da transmissão foi cuidadosamente arquitetado com o apoio de integrantes do núcleo duro do governo", afirmou.

Gonet sustentou nas alegações que a denúncia por ele apresentada "não se baseou em conjecturas ou suposições frágeis". Ele menciona que os investigadores obtiveram provas contundentes porque "a organização criminosa fez questão de documentar quase todas as fases de sua empreitada".

- Bloqueios em rodovias pela PRF

Gonet incluiu no rol de provas da atuação criminosa de Bolsonaro e seus aliados as operações realizadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) em rodovias do Nordeste do País no segundo turno das eleições, o que foi compreendido pelos investigadores como uma tentativa de restringir o acesso de potenciais eleitores petistas concentrados nessas regiões.

"Verificou-se, nesse momento, o manejo indevido das forças de segurança pública para dificultar a votação de eleitores no candidato da oposição", disse Gonet. "O intento criminoso de utilização da estrutura do Estado em benefício de JAIR BOLSONARO ficou explícito na produção de um Business Intelligence (BI) voltado aos resultados eleitorais (75% LULA)".

Gonet ainda apontou que pessoas presentes nas reuniões preparatórias das operações da PRF explicitaram que o objetivo era manter Bolsonaro na Presidência. "Essa ação foi reconhecida nos depoimentos prestados pelas testemunhas Adiel Pereira Alcântara e Clebson Ferreira de Paula Vieira".

- 'Violência e desconforto social'

A PGR afirmou nas alegações finais que, diante da derrota de Bolsonaro nas eleições, os integrantes da organização criminosa partiram para "ações de violência e desconforto social". Gonet mencionou que as diversos acampamentos golpistas em frentes aos quartéis foram coordenados e articulados pelo grupo.

"Esse foi o cenário armado para a execução da próxima etapa do projeto de sedição, em que seriam intensificadas as demandas por ações militares, elaborados os documentos necessários para formalização do Golpe de Estado e praticadas outras mais medidas de força orientadas a viabilizar o seu êxito".

Gonet embasou essas declarações com elementos como o depoimento prestado por Bolsonaro ao STF, no qual ele afirma "era melhor o pessoal ficar lá do que vir aqui para a região da Esplanada". Para a PGR, a fala do ex-presidente "demonstrou aquiescência e passividade diante dos movimentos já antidemocráticos".

Gonet também considerou como confissão a declaração de Bolsonaro sobre "achar uma alternativa na Constituição" para reverter a eleição, pois o PL tinha sido multado ao recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com questionamentos e insinuações de fraude no pleito.

"O que existiu, na prática, foi: como nós fomos impedidos de recorrer ao TSE, com preocupação de uma penalidade mais alta do que ocorrida naquela, se não me engano, de 23 de novembro, nós buscamos alguma alternativa na Constituição. Achamos que não procedia e foi encerrado", disse Bolsonaro.

Na avaliação do procurador-geral, "a fala de JAIR BOLSONARO consiste em clara confissão de seu intento antidemocrático, uma vez que o inconformismo com medidas judiciais jamais poderia servir de fundamento para a cogitação de medidas autoritárias".
Penas podem chegar a 43 anos de prisão
- Liderança de organização criminosa armada, prevista na Lei nº 12.850/2013, artigo 2º, caput, com os agravantes dos parágrafos 2º e 4º, inciso II, referentes ao uso de arma de fogo e à participação de funcionário público. Somadas as qualificadoras, a pena para esse crime pode chegar a até 17 anos de reclusão.

- O crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, previsto no artigo 359-L do Código Penal, com pena de até 8 anos de reclusão.

- A condenação pelo crime de golpe de Estado, nos termos do artigo 359-M do Código Penal, cuja pena pode chegar a até 12 anos de reclusão.

- Em relação aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, as alegações finais pedem a condenação do ex-presidente pelo crime de dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo para a vítima, conforme previsto no artigo 163, parágrafo único, incisos I, III e IV, do Código Penal. A pena para esse crime pode ser de até 6 anos de reclusão.

- Por fim, também há menção ao crime de deterioração de patrimônio tombado, previsto no artigo 62, inciso I, da Lei nº 9.605/1998, cuja pena é de até 3 anos de reclusão.

Caso a 1ª Turma do Supremo acolha os argumentos da acusação, o ex-presidente poderá ser apenado em cerca de 43 anos de prisão.
Repercussão imprensa internacional 
Para a BBC Brasil, Gonet "ignorou" as críticas públicas feitas pelo presidente dos Estados Unidos Donald Trump à Justiça brasileira e reafirmou a gravidade das acusações.
O jornal espanhol El País destacou que "Bolsonaro sabe que terá muita dificuldade em evitar uma condenação, o que o afastaria definitivamente da cena política".
O período ainda relembrou que o ex-presidente foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em junho de 2023 pela prática de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Com a decisão, Bolsonaro ficou inelegível até 2030. Assim, o ex-chefe do executivo só poderá se candidatar nas eleições de 2030.
*Com informações do Estadão Conteúdo e Agência Brasil