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'As instituições socioeducativas são verdadeiros depósitos', critica ativista da Chacrinha

Colunista convidado da semana, Sebastião Oliveira teve uma infância difícil no lixão de Gramacho e chegou a viver e a trabalhar na antiga Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor

Sebastião criou a Associação Miratus de Badminton, que fica na Chacrinha
Sebastião criou a Associação Miratus de Badminton, que fica na Chacrinha -
Sou Sebastião Dias de Oliveira, nasci no Espírito Santo, em 1965, e sou filho de mãe solteira, que trabalhava para um médico com empregada doméstica. O patrão da minha mãe a trouxe para o Rio de Janeiro para trabalhar para a família. Os dois desentenderam e minha mãe arranjou um emprego na casa de um ministro, que tinha uma residência exclusiva para seis empregados.
Minha mãe sonhou em me criar ali naquele espaço, me trouxe do Espírito Santo e me apresentou à família. Mas minha presença naquela casa foi negada. Minha mãe, então, alegou que não tinha aonde me deixar e o patrão ofereceu ajuda. Ele usou a sua influência e me internou na Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem), onde vivi dos sete aos 18 anos, convivendo com todo tipo de malandragem.
Após a morte da família do ministro, minha mãe me queria próximo à ela e alugou uma casa em Duque de Caxias. Para pagar o aluguel, trabalhava no lixão de Jardim Gramacho. Nas minhas férias, finalmente pude sentir o calor de mãe aos 12 anos ao ajudá-la no lixão catando coisas para comer. Disputávamos comida com urubus e catávamos recicláveis. Essas foram minhas aventuras na infância.
Sebastião em viagem com a equipe de badminton da Mieratus - Miratus / Divulgação
Mas aos 16 anos, um instrutor de lanternagem, mestre Isaias, que foi um pai para mim, me orientou, me alertou sobre os obstáculos da vida e clareou meus caminhos para que eu pudesse ver os obstáculos naturais e os obstáculos que se colocam em nossa frente na vida. Após desviar de vários, e aproveitar melhor as oportunidades da vida, fui aproveitado para ser funcionário da instituição da qual fui aluno.
Em 1985, aos 20 anos, fui trabalhar numa unidade de alunos infratores da Funabem. Por ter sido ex-aluno da mesma instituição, criamos vínculos, uma relação confiável e bem próxima. Os internos me viam como um irmão mais velho. Eu tirava vantagem disso para colher informações como o crime e sua escalada, por que eles se matam entre si, por que há essa guerra entre facções e como e por que eles entraram na vida do crime. Buscava entender porque tinha esperança que estas informações pudessem ser útil um dia, e no futuro poder usar a favor deles.
Na maioria das vezes a resposta é social: a falta de perspectiva na vida e a opção para sustentar seu vício e para comprar roupas e tênis de marca.
Perguntei a eles se tivessem oportunidades de sair desta vida, se sairiam. Os 100% dos entrevistados responderam "sim".
Ativista criou um projeto de badminton na Chacrinha - Miratus / Divulgação
As instituições socioeducativas criadas para ajudar na recuperação de jovens e crianças são verdadeiros depósitos, vivem entregues à própria sorte. Infelizmente 100% dos entrevistados por mim morreram ou estão presos.
O que me ajudou a não desviar minha conduta foi o esporte, essa ferramenta poderosa de inclusão social. Por isso, fundei a Associação Miratus de Badminton, na comunidade da Chacrinha, na Praça Seca. Outras pessoas se sensibilizaram com meu trabalho e se engajaram nesta empreitada.
A Miratus é um projeto de inclusão social, que ao mesmo tempo faz a capacitação de atletas de potencial olímpico. São 28 títulos pan-americanos, 45 sul-americanos, três europeus, quatro participações em mundiais e dois atletas olímpicos.
O impacto do projeto na comunidade é muito positivo. Mais de 3.700 alunos passaram por aqui. Hoje, são chefes de famílias, grandes profissionais e bários graduados. Mesmo se tratando de um esporte desconhecido da população, a comunidade busca.
O esporte tem poder de conectar pessoas e comunidades de forma efetiva. Em contextos de conflito, pode servir para encorajar o desenvolvimento de redes de integração entre comunidades em tensão - características particulares que o esporte possui -, e evidenciar o papel decisivo que pode ter na promoção do desenvolvimento e da paz.
* O texto é de responsabilidade do autor
Sebastião criou a Associação Miratus de Badminton, que fica na Chacrinha Marcelo Dias / Divulgação
A Associação Miratus de Badminton fica na Chacrinha Marcelo Dias / Divulgação
Sebastião em viagem com a equipe de badminton da Mieratus Miratus / Divulgação
Sebastião em viagem com a equipe de badminton da Mieratus Miratus / Divulgação
O ativista teve a oportunidade de fazer parte do revezamento da tocha dos Jogos Olímpicos do Rio Rio 2016 / Divulgação
Ativista criou um projeto de badminton na Chacrinha Rio 2016 / Divulgação
Ativista criou um projeto de badminton na Chacrinha Miratus / Divulgação
Ativista criou um projeto de badminton na Chacrinha Miratus / Divulgação

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