Vamos falar de racismo ambiental?

Racismo ambiental se traduz na desigualdade com a realidade das periferias
Racismo ambiental se traduz na desigualdade com a realidade das periferias -

Uma forte chuva no final de semana passado deixou um rastro de destruição e prejuízos. Casas com água até o teto, móveis empilhados e mais de dez mortes são algumas das consequências do primeiro temporal do ano no estado do Rio. Durante a semana, o bairro do Amapá, em Duque de Caxias, ainda estava debaixo d'água e moradores de Belford Roxo, Novo Iguaçu e Acari tentavam conseguir auxílio e cesta básica.

Diante de cenas que se repetem há décadas nos mesmos locais, o termo Racismo Ambiental volta ao centro da discussão, principalmente depois de Anielle Franco, ministra de Igualdade Racial, usá-lo ao mostrar que favelas e periferias são 15 vezes mais afetadas com as chuvas. A coluna do PerifaConnection ouviu Larissa Amorim, coordenadora executiva da Casa Fluminense e jornalista pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e Maria Clara Salvador, pesquisadora pela Visão Coop, ativista climática e graduada em Filosofia pela UERJ.

Para Larissa, o racismo ambiental se traduz na desigualdade e com a realidade das periferias nos dias seguintes às chuvas que castigaram o Rio. "Fica claro que os habitantes de áreas centrais não sofrem as mesmas perdas", enfatiza. Para ela, esses desastres não podem ser considerados "naturais" quando algumas regiões não contam com coleta seletiva, saneamento básico ou até mesmo abastecimento de água adequados.

Além da ausência de políticas de prevenção, os efeitos da emergência climática também contribuíram para que o impacto das chuvas fosse tão intenso. Na Zona Norte, a estação meteorológica do bairro de Anchieta registrou o volume de 259,2 milímetros de chuva em 24 horas, o maior número desde 1997.

Com a crise ambiental que o planeta vive, Maria Clara aponta para os danos diretos na vida das pessoas causados a partir de toda estrutura que engloba o racismo ambiental. "Ele é um ciclo de empobrecimento da população, porque a cada ano [após as chuvas] os trabalhadores precisam se refazer".

"As pessoas mais afetadas pela crise climática são as que menos contribuem para o aquecimento do planeta".

Quem vive na periferia tem medo dos temporais e das chamadas chuvas de verão. Não é porque as roupas na corda podem molhar ou porque pode haver engarrafamentos na volta para casa. O medo se justifica, principalmente, pelo fato de que esse temporal, na maioria das vezes, significa perder tudo o que foi conquistado dentro de casa, o fim de um empreendimento ou até mesmo a perda de familiares, amigos e vizinhos.

O medo causa um fenômeno chamado "ansiedade climática" que, segundo a Associação Americana de Psicologia, é o medo do impacto das mudanças climáticas, que acaba por gerar preocupações relacionadas ao próprio futuro e o das próximas gerações.

Ao analisar possíveis soluções ou medidas para reduzir esses impactos, Larissa Amorim destaca a necessidade de planejamento dos municípios, suporte do estado e apoio do Governo Federal. "Plano em termos de moradia, obras de ampliação das redes de saneamento básico, aumento da arborização nas periferias para que se tenha mais solos permeáveis (que permite a água passar com facilidade) e atendimento emergencial adequado no pós-chuva", analisa. "Outro ponto que precisa ser resolvido é a falta de transparência e diálogo com a população e lideranças dos territórios porque são essas organizações que estão na linha de frente de ajuda."

Caracterizando a fala de Larissa sobre as organizações serem linha de frente no primeiro apoio às vítimas, vimos mutirões de faxina, de doação e de socorro por parte dessas iniciativas sendo organizados na internet. O ativista climático Marcelo Rocha, que produz conteúdos voltados sobre justiça climática, enfatizou a força desse movimento: "A internet possui um potencial gigantesco de mobilizar pessoas, conscientizar para o combate à crise climática e destacar a interseção entre questões ambientais, raciais e sociais", explica o jovem, que esteve na favela do Acari no último final de semana.

Mas apesar disso, destacamos que a responsabilidade para reduzir esses impactos não pode vir justamente de quem sofre com eles ano após ano.

Responsabilidade para reduzir esses impactos não pode vir de quem sofre com eles
Responsabilidade para reduzir esses impactos não pode vir de quem sofre com eles Bea Domingos / divulgação

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