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Morador de rua vive história de Natal e revê a mãe após seis anos

De quase morto no Largo da Carioca ao reencontro com a família no Rio Grande do Norte, Nivaldo teve a ajuda de dois anjos da guarda

Nivaldo com a mãe, dona Cláudia (de rosa), e a equipe do hospital
Nivaldo com a mãe, dona Cláudia (de rosa), e a equipe do hospital -

Rio - Milagres de Natal existem? Sim! Com anjos e tudo, mas de carne e osso. E essa história aconteceu aqui mesmo, em meio ao corre-corre do Centro do Rio, onde um morador de rua viu sua vida ser resgatada graças à solidariedade de uma comerciária e à determinação de uma assistente social. O final feliz aconteceu no Rio Grande do Norte, onde nosso personagem principal passará o primeiro Natal em família com a mãe, depois seis anos.

Nivaldo Soares de Souza tem 51 anos e há muito tempo perambulava pelos arredores do Largo da Carioca, sem rumo. Viúvo, ficou desiludido e trocou a vida que levava pelas calçadas. Era graças à ajuda de quem passava pela região que Cabeça, como era conhecido, sobrevivia.

Na manhã de 10 de agosto, não se levantou. A ambulância dos Bombeiros foi chamada e levou Nivaldo para a Coordenação de Emergência Regional do Centro. Ele apresentava um quadro crônico, com vários problemas comuns a usuários de álcool e moradores de rua, como desnutrição, desidratação, infecções...

Três dias depois, foi transferido para o Hospital Municipal Álvaro Ramos, na Taquara, pra continuar o tratamento. Foi lá que a equipe diagnosticou outro problema — bem mais sério que os demais: Nivaldo tinha desistido de viver. Passava todo o tempo deitado no leito em posição fetal, pouco interagindo com quem cuidava dele. Não respondia a qualquer estímulo, não aceitava a alimentação e a fisioterapia.

Assistente social do hospital e já acostumada a resgatar histórias e vínculos, Luciana Dutra fazia de tudo para tentar tirar de Nivaldo lembranças que pudessem levá-la ao contato de algum familiar. Mas o esforço parecia vão. Até que ela recebeu a ligação de uma comerciária que trabalha na região do Largo da Carioca. Era Mônica de Freitas Costa, “amiga do Cabeça”. Foi ela quem chamou os bombeiros para socorrê-lo e, ao perceber que não voltava, saiu à sua procura.

“Cabeça vivia com um grupo de moradores de rua. Primeiro me ofereci pra ajudar com os cachorros deles, dando ração. Daí fui conversando com eles, principalmente com o Cabeça, de quem senti algo muito positivo. Ele disse que queria mudar de vida, parou de beber e pediu minha ajuda”, conta Mônica.

A assistente social Luciana é um dos anjos de Nivaldo - Divulgação

No primeiro contato com a assistente social, Mônica se comprometeu a tentar o contato da família de Nivaldo. Dias depois, passou para Luciana o telefone de um irmão, morador de Belford Roxo, que contou um pouco da história daquele morador de rua, que há muito tempo tinha seguido caminhos tortuosos e abandonado a família. Desgostosa, a mãe voltou pra sua cidadezinha natal, Vila Flor, no Rio Grande do Norte.

“Muita coisa tinha acontecido na história deles. Eu respeitei a decisão do irmão, mas continuei mandando informações sobre o paciente”, lembra Luciana, que tempos depois tentava um abrigo para transferir Nivaldo. Como ele se recusava a andar e a fazer fisioterapia, acabou com a musculatura atrofiada e, por isso, foi rejeitado no abrigo.

Um dia, após receber o informe sobre a saúde de Nivaldo e sobre a dificuldade de conseguir um abrigo para ele, o irmão avisou à assistente social que sua mãe, que havia ficado viúva recentemente, aceitara receber o filho pródigo em Vila Flor. Mas, por já ter 75 anos, não teria como cuidar dele. Nivaldo precisaria voltar a andar.

Ao saber disso, Nivaldo passou a se esforçar nas sessões de fisioterapia. Em pouco tempo voltou a caminhar, com ajuda de andador, e a comer todas as refeições que eram oferecidas no hospital. Recebeu visitas do irmão e da amiga Mônica, falou pelo telefone com a mãe, trocaram fotos pelo celular...

“Sérgio, meu outro filho, me mandou a foto do Nivaldo pelo celular. Estava muito magro. Mas depois me mandou outra, com ele já andando e bem mais forte”, emociona-se a mãe, Cláudia Leandro de Souza.

A comerciária Mônica foi quem chamou os bombeiros para socorrer o amigo - Divulgação

Passados mais de quatro meses desde que foi recolhido pelos bombeiros, quase morto, Nivaldo embarcou no dia 19 para o Rio Grande do Norte, com passagem fornecida por uma empresa, que também financiou a vinda de sua mãe ao Rio para buscá-lo. Na pequena bagagem, levou a segunda via da carteira de identidade recém-tirada, histórias, vínculo familiar e amizades.

“A Mônica foi muito boa pra mim. Ela me ajudava na rua, comprava remédios pra mim. Estou aqui graças a ela, ao doutor, à Luciana e às enfermeiras. Agora, morando com minha mãe, vou voltar a trabalhar assim que minha saúde permitir. Sou pedreiro, sempre trabalhei antes de ir pra rua”, disse Nivaldo, pronto para construir uma nova história. 

Nivaldo com a mãe, dona Cláudia (de rosa), e a equipe do hospital Divulgação
A assistente social Luciana é um dos anjos de Nivaldo Divulgação
A comerciária Mônica foi quem chamou os bombeiros para socorrer o amigo Divulgação