Terminou no início da tarde a paralisação dos rodoviários da Transportes Campo Grande. A greve foi iniciada ainda na madrugada desta quarta-feira (16). Funcionários cruzaram os braços por conta do não recebimento do 13º salário, mas aceitaram a proposta da empresa de dividir o benefício em mais de quatro parcelas. Linhas importantes para a Zona Oeste, como a 397 (Campo Grande x Candelária) e 369 (Bangu x Candelária) já voltaram a circular.
Mais cedo, funcionários da Transportes Campo Grande debatiam se aceitariam a proposta da empresa de dividir em cinco parcelas o recebimento do 13º. A proposta da categoria era receber em, no máximo, duas vezes. Eles também cobram a entrega de cestas básicas e o cumprimento das horas extras. "Fazemos horas extras e a empresa não está pagando. Estamos reinvindicando a carga horária: já que não estão pagando hora extra, faremos só sete horas de trabalho. A cesta básica é outro problema: vem descontada no contra-cheque, mas a gente não recebe", afirmou Edivaldo Cordeiro, um dos organizadores da mobilização.
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A paralisação mudou a rotina de quem saiu de manhã cedo para trabalhar. A auxiliar administrativa Laís Andrade teve que pegar o trem por conta da ausência do 369 (Bangu x Candelária). "Eu geralmente pego o 369. Estava indo para Campo Grande, em uma consulta médica, para depois ir trabalhar. Passei em frente à garagem, e por volta de uma 7h40 tinham muitos motoristas na porta, já imaginei que era algum problema desse tipo. Descobri que não teria nem o 369, nem o 397, então decidi ir para o trabalho de trem".
A Supervia informou que até 9h de quarta-feira, "foi observado um aumento de 3,5% no número de passageiros em relação à média das últimas duas quartas-feiras". "O ramal Santa Cruz apresentou um aumento de 2.252 passageiros (7,2%). A estação com maior crescimento absoluto foi Bangu, com uma variação de 37,7% e um ganho de 1.095 passageiros", disse a operadora dos trens.
Rio Ônibus afirma que empresas não têm dinheiro: 'dificuldade até mesmo para a compra de óleo diesel e pneus'
Segundo o Sindicato das Empresas de Ônibus do Rio, as concessionárias estão com dificuldades financeiras não só para pagamento de salários, mas até para gastos considerados simples, como combustíveis e trocas de pneus. O Rio Ônibus diz que a crise é fruto da falta de aumento da tarifa, das gratuidades sem fonte de custeio e da falta de controle do poder público sobre o transportes clandestino.
"O congelamento da tarifa há 23 meses, a expansão sem controle do transporte clandestino e a concessão de gratuidades sem fonte de custeio são alguns dos problemas que levaram as empresas de ônibus na capital fluminense a um colapso econômico-financeiro. A falta de projetos para criação de subsídios públicos, bem como o veto presidencial ao auxílio federal para empresas de transportes afetadas pela atual crise deixam as empresas jogadas à própria sorte, num cenário de abandono e incertezas. Hoje, a dificuldade não é apenas para o pagamento do 13º salário, mas até mesmo para a compra de óleo diesel, pneus e a devida manutenção da frota", afirmou, em nota, o Rio Ônibus.
"O cenário atual é o preço que se paga quando um tema tão relevante para a população não é tratado tecnicamente pelas autoridades, mas sim politicamente", completou.
Ex-rodoviário: 'a classe acabou há muito tempo'
A crise financeira e os problemas de gestão das empresas deságuam em um cenário caótico para o lado dos trabalhadores, que convivem com demissões em massa de colegas e sucateamento dos veículos, além de mudanças na própria profissão, como o fim da função de cobrador.
Nos últimos cinco anos, 17 empresas fecharam as portas e 15 mil pessoas foram demitidas, segundo cálculos do Rio Ônibus. Em setembro, a viação Jabour, que atua na Zona Oeste, demitiu 260 funcionários; a viação Flores, na Baixada, outras 300. No fim de outubro, a Marcopolo, principal fabricante de ônibus do país, fechou sua fábrica em Xerém, Duque de Caxias, e demitiu 800 funcionários.
Um ex-rodoviário foi demitido durante a pandemia. "Trabalhava em uma empresa que circula na Zona Norte e minha esposa pegou Covid-19. Moro apenas com ela. Pedi para ficar de quarentena e levei o atestado. Eles seguraram o atestado, me deixaram 15 dias em casa, mas me deram 14 faltas. Três meses depois, fui demitido", conta o profissional, que prefere não se identificar.
"Existe empresa que, se você colidir na rua, eles cobram avaria e ainda te suspendem. A gente trabalha no setor de transportes porque não temos outra alternativa. Eu já trabalhei em empresa em que o patrão chegou no meio da oficina e disse: 'não tenho dinheiro para 13º. Quer receber, vai para a Justiça'. É a certeza da impunidade. A classe acabou há muito tempo", completou.
*Colaborou o repórter Anderson Justino