Mais Lidas

Pescadores denunciam despejo de chorume no Rio Sarapuí

Material é proveniente do Aterro de Gramacho, que foi desativado em 2012. Ministério Público Federal faz vistoria no local nesta segunda-feira

Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias -
Rio - No lugar de peixe, lixo e chorume. Essa é a atual realidade do Rio Sarapuí, onde, há quatro décadas, suas águas eram a fonte de renda de aproximadamente 120 famílias, que tiravam o sustento da pesca de 15 espécies diferentes. Os antigos pescadores continuam por lá, mas hoje trabalham catando garrafas pet, latas e outros produtos recicláveis.
"Aqui dava tainha, corvina, tilápia, espada... Há uns 10 anos os peixes sumiram completamente. O problema começou com o Aterro de Gramado, com o lixo e o chorume descendo para o Rio, e destruindo também árvores e os crustáceos", diz Gilciney Lopes Gomes, de 61 anos, ex-pescador e hoje catador de materiais recicláveis no Rio Sarapuí, que nasce na Zona Oeste e corta cidades da Baixada Fluminense, como Duque de Caxias.
Na manhã desta segunda-feira, Gilciney levou uma equipe do Ministério Público Federal (MPF) a um dos pontos de deságue, no Rio Sarapuí, do chorume proveniente do antigo Aterro de Gramacho: os pescadores identificaram 12 pontos ao todo. Os técnicos colheram água para amostras, que podem subsidiar uma nova ação na Justiça.
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias. Na foto, o pescador Gilciney  - Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias. Na foto, o pescador Gilciney Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Segundo o procurador da República Júlio Araújo, mesmo tendo deixado de receber lixo da região metropolitana do Rio em 2012, o Aterro de Gramacho continua causando danos ambientais e sociais para a região de Duque de Caxias. No local funciona a empresa Gás Verde, que atua na exploração do gás metano decorrente da decomposição de resíduos depositados no aterro.
"Nós movemos uma ação penal, em 2019, contra a empresa por crime ambiental, pois ela firmou compromisso com o Inea para o tratamento do chorume do Aterro de Gramacho, mas as denúncias mostram que isso não está acontecendo. O processo está em andamento na Justiça Federal", diz o procurador Júlio Araújo.
Naquele mesmo ano, a questão também ensejou uma ação civil pública do MPF, que tenta fazer com a comunidade dos pescadores artesanais que atuam na região seja ouvida e considerada em todas as discussões e acordos entre o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e a empresa.
"Não é apenas a questão física, biológica que está em jogo, mas também a parte social, os impactos que esses danos ambientais provocam na população da região, alterando seus modos de vida e trazendo prejuízos à saúde", diz o procurador.

Hoje, Luciano Carlos, de 40 anos, que já chegou a pescar no Rio Sarapuí, conta que ele e os colegas pescam na Ilha do Boqueirão, na Baía de Guanabara. No Rio Sarapuí, só mesmo a coleta de materiais recicláveis.
"É o que acaba complementando a nossa renda. Mas é muito triste ver o rio assim. Dói no coração e na alma da gente", diz Luciano, enquanto toca o barco em direção a um dos pontos de deságue de chorume.
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias  - Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
No trajeto de cerca de 40 minutos entre a ponte do Rio Sarapuí e o local de descarte, o barco teve que parar quatro vezes para a retirada de sacos plásticos enroscados na hélice do motor. Além de sacolas plásticas, pneus, móveis velhos, garrafas pet, copos plásticos e uma série de outros detritos nas águas escuras do rio, que exala um cheiro forte de esgoto.
Gilciney dá uma dimensão do impacto social da degradação ambiental na vida das famílias da região. A maioria vive no bairro de Saracuruna, em Caxias.
"Quando o lixão foi instalado na década de 70 (1978), a cerca de 150 metros do rio, a gente não sabia da tragédia que aos poucos iria acontecer. O lixo e o chorume mataram os peixes, os caranguejos e a vegetação. Com a pesca, a gente conseguia o equivalente a R$ 500 por semana. A opção que hoje nos resta é a coleta de recicláveis, que nos rende cerca de R$ 60 por semana", diz Gilciney.
Quando o barco chega a um dos pontos de descarte de chorume, Thalles Barreto, supervisor de logística da empresa Oceanus, faz a coleta da água que corre na canaleta improvisada. O líquido, de cor amarelada, seguirá para análise em laboratório.
"Serão avaliados os níveis de metais pesados, sólidos suspensos na amostra e resíduos industriais, entre outros parâmetros como PH, temperatura e condutividade", explica o técnico.
A vistoria é também acompanhada por uma equipe do movimento Baía Viva, que faz a articulação entre os pescadores e os órgãos ambientais e de controle, e pesquisas de campo para documentar irregularidades.
Segundo o ecologista Sérgio Ricardo, um dos fundadores do movimento, são despejados três milhões de litros de chorume não tratado por dia na bacia hidrográfica da Baía de Guanabara, da qual o Rio Sarapuí faz parte. Todo o material é oriundo dos lixões da região metropolitana do Rio, que foram desativados com a Lei Federal 12.305, de 2010.
"Essa lei foi uma farsa. Para a sociedade, os lixões foram desativados, mas o passivo ambiental e social ainda continua grande. Essas famílias que viviam da pesca hoje estão na extrema pobreza, em situação de insegurança alimentar", denuncia Sérgio Ricardo.
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias  - Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
FISCALIZAÇÃO
O DIA procurou a empresa Arcadis, que já foi responsável pela Gás Verde, e informou que a companhia atualmente "não faz mais parte do grupo econômico da Arcadis e que a Arcadis não tem qualquer relação com as atividades mencionadas. Mais informações sobre as mesmas devem ser buscadas junto às próprias empresas e seus representantes". A reportagem não conseguiu contato com os atuais responsáveis pela Gás Verde.
Procurado, o Inea informou que o tratamento de chorume do Aterro de Gramacho é parte de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) celebrado com a empresa Gás Verde.
Segundo o Inea, durante a vigência do TAC foram executadas as reformas das etapas de tratamento primário e secundário da Estação de Tratamento de Chorume e introduzido um novo tratamento terciário que se encontra em fase de avaliação de performance.
O Inea afirmou que fiscaliza as ações executadas pela Gás Verde e que adota as medidas administrativas cabíveis previstas na legislação ambiental em caso de constatação de vazamento de chorume.
Sobre a atuação na região, o Inea afirma que foram realizadas, no último ano, seis operações para combater o despejo irregular de resíduos, a demolição de fornos clandestinos de carvão, supressão de vegetação e transporte irregular de resíduos, entre outros crimes ambientais.
Segundo o Inea, foram lavrados 33 autos administrativos, entre embargo de obras, interdição de local, infrações e apreensões de veículos e maquinário utilizados para a prática de infrações ambientais. Também foram demolidos 26 fornos de carvão e 12 pessoas conduzidas à delegacia.
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
O ex-pescador Gilciney Lopes Gomes, de 61 anos, hoje é catador de materiais recicláveis no Rio Sarapuí Estefan Radovicz
Amostras da água do rio foram coletadas pela equipe técnica Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias. Na foto,Sérgio Ricardo Verde Potiguara, do Movimento Baía Viva. Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo, o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia
Vistoria técnica conjunta do Ministério Público Federal de São João de Meriti, coordenado pelo Procurador da República José Júlio Araújo,(FOTO), o Movimento Baía Viva e a Colônia de Pescadores de Duque de Caxias Estefan Radovicz / Agencia O Dia