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STJ anula quebra de sigilo de Flávio Bolsonaro por ‘rachadinha’

Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça determinou que os investigadores retirem da apuração todas as informações obtidas a partir da quebra do sigilo de Flávio e outros 94 alvos, entre pessoas e empresas

Defesa de Flávio Bolsonaro já havia obtido vitórias no Supremo Tribunal Federal (STF) que levaram à paralisação das investigações
Defesa de Flávio Bolsonaro já havia obtido vitórias no Supremo Tribunal Federal (STF) que levaram à paralisação das investigações -
Brasília - A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu ontem, por 4 votos a 1, pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e anulou a quebra do sigilo bancário e fiscal do parlamentar no âmbito das investigações das "rachadinhas", que estão em andamento desde 2018. O STJ determinou que os investigadores retirem da apuração todas as informações obtidas a partir da quebra do sigilo de Flávio e outros 94 alvos, entre pessoas e empresas.

Antes da decisão favorável do STJ, a defesa de Flávio já havia obtido vitórias no Supremo Tribunal Federal (STF) que levaram à paralisação das investigações. Os advogados do parlamentar, que jogam com o tempo, já usaram a questão do foro privilegiado e o compartilhamento de informações sigilosas para travar o inquérito.

A decisão do STJ deve levar agora ao esvaziamento da denúncia apresentada pelo Ministério Público do Rio contra o filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro na investigação que apurou indícios de desvios de salários de funcionários em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Em novembro do ano passado, após mais de dois anos de investigação, Flávio foi denunciado por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Além do senador, foram denunciados o ex-assessor Fabrício Queiroz, apontado como operador do esquema, e outros 15 ex-funcionários.

Como antecipou o Estadão, o ministro João Otávio de Noronha elaborou voto que construiu uma saída jurídica para beneficiar Flávio. Em uma sessão tensa, marcada por trocas de farpas entre Noronha e o relator do caso, Felix Fischer, a Quinta Turma adiou para a próxima terça-feira a análise de outros dois recursos de Flávio, que apresentam "potencial destrutivo" ainda maior para o futuro do caso Queiroz.

Esses dois recursos podem derrubar o compartilhamento de informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) com o Ministério Público e anular todas as decisões tomadas pelo juiz Flávio Itabaiana, que conduz o processo na primeira instância, o que levaria à implosão das investigações e o retorno do processo à estaca zero.

O relatório do Coaf que subsidiou as investigações, revelado pelo Estadão, apontou movimentação atípica de R$ 1,2 milhão em uma conta no nome de Queiroz.

O julgamento de ontem foi acompanhado por Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro que se desligou do processo depois que Queiroz foi preso. O ex-assessor foi encontrado em Atibaia, no interior de São Paulo, em um imóvel de Wassef. A aparição de Wassef no julgamento de Flávio, ao lado da advogada Nara Nishizawa, provocou surpresa entre os presentes e foi vista como uma forma de "fazer média" com o presidente da República.

‘Genérico’

O julgamento de Flávio Bolsonaro foi retomado com a análise de um primeiro recurso, que questiona a quebra de sigilo do senador "As decisões de quebra de sigilo foram consideradas válidas em todos os sentidos", disse Fischer, que acabou isolado na sessão

Noronha, por outro lado, concordou com as alegações da defesa de que a decisão foi mal fundamentada. Alinhado ao Planalto, Noronha tem perfil garantista, mais propenso a ficar do lado de investigados - e tem sido criticado, nos bastidores, por tentar se cacifar para a vaga que será aberta no STF em julho.

"O magistrado não se deu ao trabalho de adotar de forma expressa as razões do pedido (do Ministério Público), apenas analisou os argumentos, concluindo que a medida era importante. Apenas isso. A decisão é manifestamente nula", criticou.

O ministro Reynaldo Soares da Fonseca concordou. "A decisão se limita a cinco linhas. Isso não pode ser considerado uma decisão fundamentada, ainda que sucinta", afirmou.

Na avaliação do ministro Ribeiro Dantas, a quebra do sigilo foi "absolutamente genérica". O ministro José Ilan Paciornik endossou a posição dos colegas. "Essa decisão está eivada de nulidade, porque carece de fundamentação adequada de acordo com as nossas exigências legais", disse.

Mesmo com o adiamento do segundo recurso, em que a defesa de Flávio questiona o relatório do Coaf, Noronha antecipou o voto pró-Flávio. "O Coaf não é o órgão de investigação e muito menos de produção de prova. Não pode ser utilizado como auxiliar do Ministério Público", afirmou.

A postura de Noronha irritou Fischer, que ainda não se manifestou sobre esse ponto. "Em 40 anos de tribunal, nunca vi o relator ficar para depois. Isso não existe!", reclamou. Segundo o Estadão apurou, Noronha também vai acolher o terceiro recurso da defesa de Flávio, que pede a anulação dos atos de Itabaiana. Foi dele que partiram as decisões mais importantes do caso, desde a primeira quebra de sigilo até a prisão preventiva de Queiroz.

"O julgamento me pareceu um bom presságio para o pedido principal, que é a anulação de todas as decisões proferidas pelo juiz da 27ª Vara Criminal", disse o advogado Rodrigo Roca, um dos defensores de Flávio.