Cientistas alertam que obra que coloca concreto na areia da Praia da Barra é ineficaz e danosa

Pesquisadores e geocientistas marinhos de universidades do Rio fazem manifesto e tentam impedir intervenção entre os postos 7 e 8 da orla

Obras da Prefeitura do Rio na Praia da Barra serão desfeitas
Obras da Prefeitura do Rio na Praia da Barra serão desfeitas -
Rio - Um grupo de 21 pesquisadores e geocientistas marinhos ligados a universidades do Estado do Rio tentam impedir as obras que são realizadas na faixa de areia entre os postos 7 e 8 da Praia da Barra, na Zona Oeste do Rio. São acadêmicos da UFRJ, Uerj, Uff e PUC-Rio que alertam para a ineficiência da construção e questionam o fato da Prefeitura do Rio não ter consultado os especialistas para realizar a intervenção. O grupo produziu um manifesto em conjunto e denunciou o caso aos ministérios públicos estadual e federal. 


A obra visa a recuperação de danos decorrentes de ressacas. No local, dá pra ver a área escavada e homens colocando a manta de concreto no espaço. As imagens surpreenderam a comunidade acadêmica fluminense que desenvolve pesquisas sobre geomorfologia costeira, dinâmica de praias, erosão e vulnerabilidade costeira nas praias da cidade do Rio de Janeiro, incluindo este trecho da Barra da Tijuca.

"Os pesquisadores desconheciam a realização de uma intervenção de engenharia naquele trecho da praia, não estavam cientes de qualquer intenção da prefeitura neste sentido, não tomaram conhecimento dos estudos preparatórios para realização da obra e não foram consultados em nenhum momento pelo poder público", registram no manifesto.

Os especialistas afirmam que a utilização de estruturas rígidas, como concreto, para solucionar problemas relacionados a danos por erosão costeira neste setor da praia são considerados ineficientes e danosos por pesquisadores brasileiros e internacionais.

"Parece não ter sido respeitado o Guia de Diretrizes de Prevenção e Proteção à Erosão Costeira, publicado em 2018 pelo Ministério do Meio Ambiente. Estes tipos de soluções, baseadas em obras rígidas, podem inclusive agravar a erosão, gerar danos ecológicos e causar a desvalorização da paisagem pela exumação de escombros de concreto que podem se quebrar e ficar expostos na areia da praia em momentos de ressaca. Do ponto de vista ecológico, existe importante impacto em toda endofauna que habita as areias da praia", diz outro trecho do texto.

Os especialistas afirmam que soluções alternativas baseadas na natureza devem ser consideradas. Elas dialogam com os mais atuais debates na ciência nacional e internacional sobre recuperação de praias, dizem os cientistas.

Estudos realizados ao longo dos últimos anos demonstram que as praias apresentam grande variabilidade de sua largura, com redução do estoque de areias durante eventos de ressaca do mar, mas recuperando-se ao longo de períodos que podem estender-se por dias a alguns meses.

Outros estudos apontam que o aumento da destruição de estruturas urbanas, como quiosques e calçadão, estão em muitos casos associados às intervenções humanas através de alterações das dunas e restingas que formam barreiras naturais de proteção da costa e que vêm sendo sistematicamente removidas, além de uma tendência de avanço da urbanização para dentro da área mais dinâmica das praias, que, em tese, deveria ficar livre de edificações.

Os cientistas chamam a atenção para a possibilidade do Rio de Janeiro se tornar um exemplo de boa gestão das questões relacionadas à erosão costeira, mas ponderam que a gestão precisa estar à frente dos debates atuais e não reproduzir soluções ultrapassadas e inadequadas.

"Por mais sofisticadas e pomposas que possam parecer, as obras que negam a fragilidade e a complexidade dos sistemas costeiros e oceânicos serão descartáveis, como temos testemunhado na praia da Macumba e na praia de Camboinhas (Niterói), além de altamente custosos ao erário público", diz a nota.

O documento solicita , por fim, que a comunidade acadêmica seja devidamente informada e consultada antes da tomada de decisões que incidem sobre este importante ecossistema da cidade do Rio de Janeiro, garantindo o respeito à ciência e aos trâmites legais exigidos neste caso.