Dono de casa ouviu filhos pedindo ajuda após desabamento no Complexo do Lins

Rio - O dono da casa que desabou nesta segunda-feira (1º) no Morro da Cotia, no Complexo do Lins, na Zona Norte do Rio, relatou os momentos de tensão que viveu até ser resgatado. O bombeiro hidráulico Rafael Torres Suzano, de 36 anos, permaneceu acordado e lúcido a todo momento, chegou a ouvir pedidos de socorro dos filhos e tentou resgatar parentes. A desmoronamento provocou a morte de um homem e deixou oito pessoas feridas. 

De acordo com o bombeiro hidráulico, o imóvel de três pavimentos não tinha rachaduras e não apresentava sinais de que estava cedendo. Entretanto, segundos antes do desabamento, as luzes da residência piscaram rapidamente e ele foi arremessado para frente, caindo por cima de uma televisão. Apesar do impacto, ele conta que não desmaiou e, nesse momento, passou a ouvir pedidos de socorro de familiares e a tentar resgatá-los. 

"Eu ouvi gritarias, minha filha, meu filho, um momento muito triste (...) Imagina você estar amarrado? Eu não estava amarrado, mas eu estava preso, os dois braços presos sob os escombros. Estava ouvindo minha filha próxima ao meu pé, pedindo para salvar o filho dela e para salvar todo mundo e eu pedindo calma à ela, porque eu não consigo. No momento que eu estava lá preso, eu não tinha o que fazer, por mais força que eu coloquei. Teve um momento que o pessoal tentou levantar uma laje e eu com as costas tentei, também, impulsionar. Parecia e foi em vão. Um momento muito ruim e difícil de se descrever", lamentou o dono do imóvel.

Segundo o Corpo de Bombeiros, o quartel do Grajaú foi acionado por volta das 20h para a Avenida Menezes Cortes, no número 820, no Engenho Novo, e resgatou quatro pessoas com vida, sendo elas um bebê, duas mulheres e Rafael. No local, as equipes foram informadas que uma criança já havia sido socorrida por moradores e outras três pessoas também foram tiradas dos escombros antes da chegada dos militares. As vítimas foram encaminhadas para três hospitais. Além deles, Daniel Linhares, de 23 anos, foi encontrado sem vida pelas equipes.

"Infelizmente, peço desculpa à família do Daniel, porque não foi coisa premeditada. Ele era amigo dos meus sobrinhos, ele estava aqui constantemente. Se fosse uma coisa que eu já sabia, rachadura, uma coisa assim, eu teria saído, tirado minha família, para isso não acontecer. Bens materiais, estou triste, mas estou muito alegre por toda a nossa vida e um pedacinho da grande tristeza da família do Daniel. Que isso venha servir para mim e para todo mundo com uma lição de vida", declarou Rafael.

De acordo com o Hospital Federal do Andaraí, na noite de segunda (1º), uma mulher identificada como Rosilene da Silva e Valentina da Silva, de 5 anos, deram entrada no local. A criança recebeu alta hospitalar na manhã desta terça-feira, enquanto a mulher segue internada em estado estável.

Já a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informou que três vítimas do desabamento foram levadas para o Hospital Municipal Salgado Filho, no Méier. Ravi da Silva, 1 ano, e Rawana da Silva, 16 anos, permanecem na unidade, enquanto Rafael recebeu alta. No Hospital Municipal Souza Aguiar, no Centro, há mais três internados: Vitória da Silva Barbosa, de 21 anos, Lavínia da Silva, 2 anos, e Yan da Silva, de 5 anos. Todos estão em estado estável.

Na casa, viviam dez pessoas da mesma família e apenas dois sobrinhos do bombeiro hidráulico não estavam no imóvel no momento do desabamento. Na manhã desta terça-feira (2), Rafael esteve no local e reencontrou seu cachorro, que estava vagando pelos escombros da residência. Apesar de muito abalada, a vítima agredeceu pelo trabalho dos bombeiros e a colaboração dos vizinhos e disse se sentir feliz por estar vivo. 

"Todo dia eu penso em agradecer (a Deus), hoje mais do que nunca. Uma situação muito delicada porque eu me recordo de todo o lance, não dormi, não apaguei, não desmaiei, fiquei nítido nas coisas que estavam acontecendo, nos vizinhos que vieram, graças a Deus, socorrer. Quero agradecer muito ao Corpo de Bombeiros, porque para mim, que estava li embaixo (dos escombros), achei muito rápido. Só tenho que agradecer muito a colaboração de todos, entre homens, mulheres, crianças, amigos, pessoas próximas, acredito que até pessoas distantes vieram, se mobilizaram, isso que a gente chama de humanidade. O melhor louvor que eu tenho hoje é saber que estou vivo".

De acordo com a Defesa Civil municipal, o imóvel era uma construção irregular, erguida em uma encosta, que não suportou o peso da estrutura e acabou desmoronando. O órgão realizou vistorias na comunidade na manhã de hoje e outras duas casas também foram interditadas. Segundo a Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS), três famílias foram afetadas, impactando 21 pessoas, sendo dez adultos, duas lactantes, seis crianças e três adolescentes.

Os moradores vizinhos ao imóvel que desabou recusaram acolhimento e estão na casa de parentes. Eles receberam o cartão Protege SUAS para acesso a insumos emergenciais. A pasta informou ainda que "dará continuidade ao atendimento para identificação correta do número de núcleos familiares existentes". A SMAS ainda acompanha familiares de Daniel para os trâmites no Instituto Médico Legal. O caso foi registrado na 25ª DP (Engenho Novo) e será transferido para investigação na 26ª DP (Todos os Santos).