Rio - Duas mulheres registraram queixas, nesta quarta-feira (7), contra o mesmo homem após sofrerem ofensas racistas nos hortifrutis que trabalham. De acordo com as denúncias, ambas foram chamadas de "macacas" em episódios e estabelecimentos distintos. A Polícia Civil investiga os casos.
Ao DIA, a operadora de caixa Rayara Gabriele, de 24 anos, que trabalha em um hortifruti de Botafogo, na Zona Sul, contou que o autor, de 66 anos, chegou na loja, em dezembro do ano passado, e foi para o lado errado da fila. Ao o informar sobre o fato, o idoso não teria gostado e começou a ofendê-la.
"Como o hortifruti é pequeno, a fila formava uma volta só. Ele entrou do lado de saída da fila e eu informei que tinham pessoas na frente. Ele não gostou e começou a me ofender falando que minha raça não ia para frente, que a minha raça era podre. Eu comecei a entender quando ele me chamou de macaca. Ele saiu da loja e me chamou. Esse dia foi bem ruim para mim porque eu não esperava escutar isso de alguém, ainda mais nos dias de hoje", disse a jovem.
Segundo Rayara, ela não prestou queixa na época porque não teve apoio psicológico. No entanto, a mulher soube, através das redes sociais, de um caso parecido com uma conhecida dela e reconheceu o idoso como o autor dos xingamentos.
"Eu moro em Inhaúma e ela é uma conhecida minha. Ela postou que sofreu racismo e divulgou as imagens. Quando eu vi, eu olhei as imagens que eu tinha e vi que o agressor era o mesmo. Ela relatou o que ouviu e eu vi que era parecido. Eu só espero que a justiça seja feita e ele pague pelo crime que cometeu. Isso não é normal e não pode acontecer. É bem triste. A gente não sabe o que esperar com esse homem solto fazendo maldades com pessoas na rua ou até mesmo algo pior", completou Rayara.
Em 28 de abril, Fernanda da Costa, de 30 anos, operadora de caixa de um hortifruti de Inhaúma, na Zona Norte, também teria sido alvo de racismo cometido pelo mesmo homem. Ao DIA, a mulher contou que o idoso desejou até sua morte.
"Eu estava no caixa e esse senhor chegou na fila da menina do lado, sendo que ela já estava atendendo uma pessoa. Quando eu o vi, eu falei 'próximo' e ele balançou a cabeça com sinal negativo. Eu perguntei a ele se estava com a cliente do outro caixa e ele afirmou que sim, sendo que essa cliente é sozinha, a gente conhece ela. Nisso, ele começou a resmungar alguma coisa que eu não entendi. No final, só escutei 'raça' e já imaginei que tratava de algo sobre racismo. Eu falei 'não entendi' e ele começou a falar alto e em bom tom que negros não valem nada, que merecem morrer, que são imundos e que nem o Diabo quer, que é uma ofensa para a Igreja Católica a gente trabalhar de frente pra igreja, macaca, um monte de coisa. Na hora, fiquei muito nervosa e comecei a chorar. Aquilo me incomodou tanto. Muito constrangedor", destacou.
Nesta quarta-feira (7), o suspeito voltou ao hortifruti onde Fernanda trabalha, mas deixou o local quando a viu. Ele foi seguido por um dos entregadores e, posteriormente, pela mãe da vítima, que chamou policiais para levá-lo a uma delegacia.
"Fiquei desacreditada do que presenciei. Eu espero que ele pague pelo que fez. Tenho um filho de 2 anos e penso no futuro dele também, isso precisar acabar. Só eu e Rayara que tivemos coragem para fazer justiça. Isso não deveria acontecer com ninguém, é deplorável", finalizou a mulher.
O caso de Rayane foi registrado como injúria racial na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi). Já o registro de Fernanda ocorreu na 44ª DP (Inhaúma) como injúria por preconceito.
Mudança na tipificação
Ambos os casos são acompanhados pela advogada Louize Andrade. Ao DIA, a defesa contou que deseja a mudança da tipificação do registro de Fernanda, pois foi feito por um crime mais leve.
"Colocaram como injúria preconceituosa, um crime mais leve do que aquele previsto na lei de crimes raciais, como a injúria racial, que prevê uma pena de dois a cinco anos. A injúria por preconceito tem elementos referentes à religião e à condição de pessoas idosas. Ofensas a cor, raça e etnia já partem para o crime específico da lei de crimes raciais. Um erro como esse no registro de ocorrência impede a atuação da autoridade policial pela prisão preventiva. É um crime bem mais leve", explicou.
Andrade informou ainda que entregou as imagens dos estabelecimentos para as delegacias e afirmou que irá pedir a prisão do idoso.
"A defesa vai fazer o pedido de prisão preventiva porque a conduta que esse senhor tem tomado é reiterada. Ele pratica esses ataques racistas já não é de hoje. Outras funcionárias dos hortifrutis se sentiram ofendidas. Em Inhaúma, a maioria são pretas e pardas. Ele ofendeu todo o quadro de funcionários e a gente entende que, para a proteção das vítimas, tem que ser decretada a prisão preventiva desse homem", completou.
O suspeito esteve na 44ª DP nesta quarta-feira (7), prestou depoimento e foi liberado. Questionada, a Polícia Civil informou que as investigações estão em andamento para apurar todos os fatos.