Quem acompanha Érick Jacquin na televisão conhece bem o chef exigente, de sobrancelhas franzidas e críticas certeiras que não poupam nem os candidatos mais confiantes do Masterchef. Mas há um outro Jacquin - generoso, emotivo - que agora ganha destaque no documentário Jacquin Como Você Nunca Viu!, disponível no Amazon Prime Vídeo.
Dirigido por Eric Belhassen, o filme acompanha a trajetória do chef francês que deixou Paris, enfrentou a falência no Brasil e renasceu como um dos maiores ícones da gastronomia e do entretenimento brasileiros. É uma história de recomeços, temperada com generosidade, lágrimas e trabalho duro.
"Todo mundo tem uma personalidade com três dimensões, às vezes quatro. Para pessoas públicas, é uma coisa ainda mais forte, porque pouco a pouco tem de colocar uma carapaça para não ser muito vulnerável", explica Belhassen ao Estadão. O diretor conheceu Jacquin há mais de 15 anos, durante as filmagens de Por Que Você Partiu, seu primeiro documentário sobre chefs franceses radicados no Brasil.
Naquela época, em 2009, Belhassen capturou uma cena reveladora: Jacquin brigando agressivamente com sua equipe no restaurante La Brasserie, na Rua Bahia. Quando o diretor perguntou se deveria manter a sequência, o chef não hesitou. "Ele viu a cena e falou: pode pôr, pode pôr a cena", conta Belhassen. Aquela decisão corajosa - aceitar mostrar um lado nada lisonjeiro de si mesmo - chamou a atenção de um produtor de TV e acabou pavimentando o caminho para o Masterchef.
O documentário mergulha no episódio mais doloroso da vida de Jacquin: a falência do La Brasserie. "Foi traumático para ele, foi um momento muito forte, no qual ele quase ia embora do Brasil", revela o diretor. Ao lado da mulher, Rosângela, o chef francês estava prestes a abandonar o País quando tudo desmoronou. Mas dessa queda nasceria sua reinvenção.
"É uma coisa que não se pode negar: ele é um cara extremamente generoso, justo. Quando ele vê um jovem que quer trabalhar, que é apaixonado, ele vai pegar e vai ajudar", diz Belhassen. O filme mostra essa faceta menos conhecida - o homem que coloca dinheiro no bolso de amigos em dificuldades financeiras, que se emociona e chora, que brinca com colegas em competições espontâneas de bebida de coco verde.
Amizade
A relação entre diretor e chef, construída ao longo de anos, permitiu que as câmeras capturassem momentos genuínos. "O acordo era: filme o que quiser, mas me deixa fazer o meu trabalho", recorda Belhassen. Houve tensão, claro - ambos são perfeccionistas. "A gente brigou algumas vezes. Teve um momento em que ele falou: 'Não, não vai ser assim porque aqui é minha cozinha'. E eu respondi: 'Não, vai ser assim porque aqui é meu set'", conta.
O resultado é um retrato íntimo que equilibra a agressividade televisiva com a doçura familiar, a exigência profissional com a vulnerabilidade emocional. Nas cenas filmadas na França, com a família de origem, emerge um Jacquin ainda mais delicado.
Além de entreter, o documentário tem inspirado. "Nas redes sociais, a gente já recebeu alguns comentários falando que esse filme deu vantagem, deu força para continuar e lutar, como o Jacquin fez", conta Belhassen. A trajetória do chef - do estrelato às dívidas, da quase desistência ao império de inúmeros restaurantes - ressoa especialmente entre os que enfrentam os próprios recomeços.
O diretor pensa em uma continuação. "Talvez fazer a segunda parte, a partir do momento que ele encontrou um novo parceiro para a gastronomia, quando começou a construir esse universo de restaurantes", diz. Afinal o que não falta na história de Jacquin é tempero.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

