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PL Quest promete álbum e fala sobre mensagem em sua letras: ‘Mostrar que favela não é só tráfico’

Com mais de 2 milhões de ouvintes mensais, rapper é cria da Chumbada, em São Gonçalo, e lançou uma música inédita na última quinta-feira

Apesar de ter se mudado para o Recreio, PL Quest continua frequentado a Chumbada
Apesar de ter se mudado para o Recreio, PL Quest continua frequentado a Chumbada -
"Quem acredita sempre alcança." O trecho inicial de Chumbada, canção que leva o nome da comunidade em São Gonçalo onde ele nasceu e cresceu, ilustra bem a vida de Paulo Lourenço. Mesmo tendo que trabalhar como ambulante, vendedor de loja e outras coisas, o rapper jamais deixou de acreditar que conseguiria realizar o sonho de viver de música, e conseguiu. Com quase 230 mil seguidores no Instagram e mais de 2,1 milhões de ouvintes mensais no Spotify, PL Quest é um dos nomes da nova geração do rap, gênero que não para de crescer no Brasil. Ao MEIA HORA, o artista de 23 anos relembrou sua trajetória até o sucesso e contou deu detalhes sobre o seu tão aguardado primeiro álbum, que será lançado ainda em 2022.

"Sou cria da Chumbada. Meu pai é cria de lá. Nasci, fui criado e aprendi tudo que eu sei lá. Meus coroas me passaram a educação dentro de casa, mas é na rua que a gente aprende muita coisa. Hoje em dia, aluguei um apartamento no Recreio, pra ficar mais perto da correria. Porque ser artista é um bagulho bem difícil, mas a gente se esforça. Mas frequento a Chumbada ainda. Tô lá direto."

PL contou como foi sua infância na Chumbada, destacando a importância dos seus pais diante das dificuldades.

"Pra quem mora em favela, nada é muito fácil. Porque o estado, o sistema, eles não olham do mesmo jeito que nós olhamos pra dentro do morro. A favela é bem abandonada. Mas graças a Deus, meus coroas correram muito atrás, pra gente nunca passar fome nem nada. Deram a assistência que eu precisava. Nunca tive fartura, mas nunca passei fome. Tinha vezes que era três dias só arroz e ovo."

Paulo também apontou as principais dificuldades que teve por crescer na comunidade, relatando a escassez de direitos básicos, como transporte e saúde.

"Lá é bem mais difícil transporte, saúde. Pra você chegar até uma UPA é mais difícil. Chegar a qualquer lugar é mais difícil. E o preconceito também, né? Quando perguntam de onde a gente é e nós falamos, algumas pessoas não entendem de uma forma certa. Muitas das vezes é mais difícil arrumar emprego, por conta da dificuldade de pegar um busão. Os caras não querem pagar várias passagens pra quem mora dentro da favela."
Cria de favela, PL Quest nasceu na comunidade da Chumbada, em São Gonçalo - Divulgação / Lucas Araujo
Por ter vivido desde pequeno na Chumbada, Paulo Lourenço sabe muito bem o que falta na favela. Entretanto, o rapper falou que um problema específico chama mais atenção.

"Saneamento básico. O esgoto é a céu aberto em várias partes da favela. A comunidade tinha que ser asfaltada em vários lugares que é muito difícil de passar. Prejudica demais."

Apesar dos problemas, PL Quest tem muito carinho por tudo que viveu e ainda vive na comunidade. O artista falou sobre alguns aprendizados que leva pra vida da sua vivência no local.

"Se eu tivesse que falar uma coisa só, seria difícil. Mas a parada que eu mais aprendi foi saber dividir com os meus crias no dia a dia. Porque lá no morro, quando eu tinha um real, era pra todo mundo. Lembro eu, Betão, Nathan, que são meus produtores hoje em dia. Quando um dos amigos tinha qualquer dinheiro, arrumava qual cinco reais a mais e nós íamos lanchar, a gente dividia o lanche pra geral. Aquele refrigerante no final do futebol, quando um tava duro e não tinha condições de bancar, com a gente não tinha neurose, a gente dividia."

Antes de estourar na música, Paulo lembra que trabalhou em diversas funções diferentes para manter seu sonho vivo.

"Já fiz bico de garçom, já trabalhei de vendedor ambulante na rua, com aqueles carrinhos que você vende edredom e panela. Trabalhei nas lojas Marisa e na WQS também. E tudo isso eu fazia pra gravar os meus sons num estúdio, porque como eu falei, morando na favela, tudo era mais difícil. E gravar música se inclui nisso. Por isso onde me chamavam pra trampar, eu tava abraçando. Tinha que fazer o dote. Porque meus coroas trabalhavam também, mas eles não tinham dinheiro sobrando pra eu tentar fazer uma parada assim. Então eu trabalhava pra fazer meu dinheiro e investir no meu sonho."

Sobre o gosto pela música, PL lista algumas de suas referências e conta como começou a rimar, quando tinha apenas 12 anos.

"Eu sempre curti música. Escutava muito Charlie Brown e tinha minhas referências de favela mesmo, que eram no funk. Mas eu via o Charlie Brown mesmo como melodia e poesia. Aí no ano que eu entrei na escola Adino Xavier, em São Gonçalo, que eu comecei a rimar, eu tinha 12 anos. Lembro até que um menor que me incentivou a rimar foi o Ruan. Ele era até mais velho, era repetente. Nós ficávamos rimando pra caraca. Até que eu conheci o Beny e fiz um grupo de rap, em 2013, chamado Questione. E nós ficamos nessa correria por vários anos, até 2017. Na real não acabou. Questione somos nós mesmos, eu e o Beny Free. Mas o bagulho começou a fluir mesmo depois que eu virei segunda voz do Orochi no show. Aí chegou a quarentena e eu soltei um som com ele, que começou a expandir meu trabalho."
PL Quest é um dos novos nomes que vem crescendo na cena do rap - Divulgação / Lucas Araujo
O cantor explica que seu nome artístico é uma referência a essa época.

"PL de Paulo Lourenço, e o Quest é de Questione, minha primeira banda, muito importante pra mim. Eu sou o PL da Questione."

Viver de música não é tarefa fácil. Contudo, Paulo Lourenço conta que sempre recebeu o apoio de sua família.

"Meus coroas sempre acreditaram muito em mim, mas no começo eles tinham aquele medo de eu me frustrar. Porque o sonho de ser artista não é fácil pra ninguém. Eles sempre pediam pra eu ter um plano B. Só que eles não sabiam que o meu plano B era o mesmo que o A. Só fazia o corre mesmo pra fazer um dote e investir no meu som. Mas eles sempre me apoiaram."

Ainda sobre família, quando começou a ganhar notoriedade com a música, PL foi surpreendido com a notícia de que seria pai. O cantor conta como tem sido a experiência de se dividir entre a vida de artista e a criação de sua pequena filha, de apenas 9 meses.

"Foi uma responsa. Na hora foi um susto, mas eu consegui administrar bem. Graças a Deus também, quando minha filha veio as coisas já estavam começando a andar. Não tive dificuldade pra poder pagar o parto. A MainStreet (gravadora) também sempre me deu suporte. Só deu uma travada nos meus lançamentos, porque como eu disse, é uma responsa muito grande. Aí eu fiquei um pouco mais focado na família. Agradeço muito a Deus por minha filha estar aí, saudável e bem. Ela me deu mais força ainda pra agora eu tá me organizando e fazer a parada girar, e fluir."
PL Quest é pai de uma menina de 9 meses - Divulgação / Lucas Araujo
Mesmo curtindo outros gêneros musicais, o cantor, que participou de sucessos como Fragrância e A Cara do Crime, explica o que o fez optar pelo rap.

"Desde menorzão eu sempre curti um hip-hop. Ficava dançando nas festas de família, era atração. Com o tempo eu cresci e comecei a escrever umas paradinhas. Aí quando fiquei mais velho, entrei na escola e comecei a rimar. O que me fez ver que eu poderia viver disso foram artistas como Filipe Ret, Oriente entre outros", explica ele, que também canta hits como Camisa da França e Polo Preta.

Há alguns anos atrás, o funk era visto por muitos jovens de favela como uma oportunidade de mudar de vida. Contudo, atualmente, o gênero vem perdendo espaço nas comunidades para o rap. PL Quest opina sobre essa mudança.

"Eu acho que com o tempo começaram a aparecer muitos artistas de rap, aí geral já foi curtindo e acreditando que tinha como. Temos exemplos como o Ret, Orochi, Oriente, Costa Gold… Essa música começou a entrar muito na favela e a galera começou a abraçar. E no caso do funk, na minha opinião ainda tem muito a ver com o rap. Porque a linguagem do rap hoje em dia é a mesma que a do funk. Os gêneros não brigam. Do mesmo jeito que tem funkeiro que fala de rap, tem muito rapper cantando funk. Ali tudo tem a ver com a favela. Mesma linguagem, só muda a batida."

Além de ser uma expressão artística, o rap é conhecido pelo seu viés social, e esse é um dos caminhos seguidos por PL, o que pode ser exemplificado nas músicas Chumbada e Falta Bem Menos do Que Ontem. O cantor fala sobre a importância de retratar a realidade em suas canções, onde ele também tenta inspirar outras pessoas que vieram da favela.

"Eu faço músicas nesse estilo porque é muito bom você escutar uma música que te inspire a não desistir. Porque quando eu faço as minhas músicas, eu faço não só pras pessoas, faço pra mim também. Às vezes eu canto uma parada que eu quero escutar, tá ligado? Tipo: 'falta bem menos do que ontem.' Porque é matar um leão todo dia. 'Quem acredita sempre alcança', já dizia Renato Russo. Isso eu até botei na música Chumbada.”

Contudo, Paulo fala que nem sempre a mensagem é entendida, e algumas pessoas confundem o retrato da realidade como uma tentativa de fazer apologia ao crime, o que segundo ele, não é a intenção.

"O que a gente canta às vezes pode ser considerado pesado, mas é a realidade. Eu lembro lá atrás, quando o MC Frank e o MC Tikão foram presos por apologia ao crime, eles colocaram um exemplo. A Ivete Sangalo canta sobre a felicidade da Bahia. Nós que moramos em favela, mostramos a realidade. Lá tem droga, arma, mulher… Tem tudo e essa é a realidade. No filme passam as coisas e ninguém reclama. Vagabundo só quer 'nevoeirar' quando é um favelado cantando."
PL Quest não se afastou de suas origens - Divulgação / Lucas Araujo
Ainda sobre a realidade das favelas, em um trecho da música Chumbadas, PL canta: 'Não me envolvo mas conheço quem trafica'. O cantor explica que assim como muitas pessoas que cresceram na favela, infelizmente ele acabou perdendo alguns amigos para o tráfico.

"Acho que não existe nenhum cria de favela que não perdeu um amigo no morro. Se eu parar pra contar da minha infância até hoje, foram vários. E nesse verso que eu falo em Chumbada, é o mais real possível. Não tem como o sistema bater neurose comigo porque eu tenho um amigo bandido. Como é que então vou ter um amigo bandido se eu fui criado perto deles? Meu papel é tentar mostrar a melhoria pra eles também. Lembro que antigamente, a graça do morro era vagabundo querer ser jogador ou bandido. Hoje em dia, e não tô falando só por causa de mim, mas eu virei referência na minha favela. Vários menores querem ser rapper, porque eles viram que hoje em dia eu tô conquistando as minhas paradas, tá ligado? E eu tive a chance de dar emprego pra muita gente. Minha equipe é só meus crias. São oito pessoas. Tentei resgatar todos os meus crias da relíquia pra trabalhar e ficar bem que nem eu tô ficando."

Lançamento de Melhoria e primeiro álbum

Na quinta-feira (19), PL Quest lançou a música Melhoria, que é justamente um recado para aqueles que estão na batalha por um futuro melhor.

"Fiz essa faixa pra ajudar geral que acredita. E também pra quem não tá acreditando em si, tentar acreditar. Acreditar que você pode ser o que você quiser ser, independente de onde você veio. Você pode ser um músico, jornalista, jogador, etc. O que você quer, você pode conseguir. Aprendi que só trabalhando tanto mesmo pra vida melhorar. Convido todos vocês a escutarem essa música lá no canal da MainStreet. Se você está desanimado, acredite! Tudo pode melhorar."

Mesmo admitindo que tenta atingir todos os públicos com suas músicas, Paulo Lourenço explica que um dos seus principais focos é inspirar quem tem uma origem parecida com a dele.

"A gente canta pra quem é da Barra, pra quem é de condomínio, canta pra quem é de qualquer lugar. Mas o foco mesmo é inspirar todos os menorzinho da favela a fazer o bagulho. Mostrar que o caminho da favela não é só tráfico, não é só droga. Lá no morro, graças a Deus onde a gente passa, as crianças querem conversar com nós. Elas se inspiraram mesmo."

Ganhando cada vez mais espaço na cena do rap e viajando o Brasil, PL Quest abriu o coração e dividiu alguns dos seus sonhos.

"Tô muito feliz com o que eu conquistei até aqui. Hoje em dia eu ando no meu carro e fico realizadão. Eu passo na rua onde eu rimava, na Praça da Trindade, aí fico pensando: 'Eu tô dentro do meu carro, com o ar-condicionado ligado, passando por onde eu batalhei pra caraca.' Meu sonho mesmo é botar uma casa de frente pra praia, com os meus coroas. Poder dar um carro maneiro pro meu pai e pra minha mãe. E na minha carreira, eu quero muito que ela seja internacional um dia. Isso é um sonho meu de relíquia, e essa é minha meta", conta ele, que fez aniversário na última sexta.

Por fim, PL Quest contou em primeira mão o nome do seu primeiro álbum, que se chamará Adrenalina, e que sairá ainda em 2022.

"Essa ano vai sair o meu álbum mesmo. Vai se chamar Adrenalina. O álbum fala da correria, porque todo esse tempo eu tô correndo atrás do bagulho e é sempre uma adrenalina diferente. Data eu ainda não posso explanar, porque eu tô trabalhando muito, focadão mesmo pra entregar um bagulho bonitão pra geral. Porque é meu primeiro álbum, né? Não tem como eu errar", concluiu.

Apesar de ter se mudado para o Recreio, PL Quest continua frequentado a Chumbada Reprodução
PL Quest é um dos novos nomes que vem crescendo na cena do rap Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest é pai de uma menina de 9 meses Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest lançou na última quinta-feira (19) a música "Melhoria" Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest tem mais de 2 milhões de ouvintes mensais no Spotify Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest participou de músicas de sucesso como "Fragrância" e "A Cara do Crime" Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest tinha um grupo de rap chamado Questione Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest não se afastou de suas origens Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest na comunidade da Chumbada, onde é nascido e criado Reprodução
Cria de favela, PL Quest nasceu na comunidade da Chumbada, em São Gonçalo Divulgação / Lucas Araujo
PL Quest é nascido e criado na comunidade da Chumbada, em São Gonçalo Divulgação / Lucas Araujo

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