Sucesso nos anos 2000, Bonde do Vinho volta com nova formação e novidades: 'Vem muita alegria por aí'

Muito antes de se pensar em TikTok, um grupo de funk já fazia sucesso com dancinhas divertidas e letras que grudavam na mente de todo mundo. No começo dos anos 2000, era impossível ir em uma festa e não escutar algum sucesso do Bonde do Vinho. Fundado em 1999, na Cidade de Deus, o grupo colecionou hits como I Feel Vinho, Desce Sobe e Múmia, fazendo sucesso por todo o Brasil. Mais de 20 anos depois e com uma nova formação, o grupo segue firme e forte, prometendo muitas novidades em breve, incluindo músicas novas com direito a clipes.

Único remanescente da formação inicial, o vocalista William Campista, de 38 anos, falou sobre essa nova fase do Bonde do Vinho, relembrando também o começo da trajetória do grupo na Cidade de Deus.

"A relação que nós temos com a Cidade de Deus é de quem foi nascido e criado. Tudo muito bom, graças a Deus. Mas a gente precisa de muita coisa lá. De outros olhares, obras, saneamento. A Cidade de Deus é um lugar que a gente gosta de morar. Apesar dos problemas, tem muita ação social lá, o que é bom pra criançada", contou ele, que ainda mora na comunidade, assim como os dois novos integrantes, os dançarinos Alex de Carvalho, conhecido como Lequinho, de 33 anos, e Diego Araújo, o DG, de 26. O grupo ainda conta com o DJ João Lucas, o João CDD, de 27 anos.

William, também conhecido como Will, falou sobre as principais dificuldades que o morador da Cidade de Deus encontra até hoje.

"A principal é ser mal visto. Acham que você não tem estudo, que não vai ser ninguém na vida. Isso é o que traz dificuldade pra quem mora lá dentro. Mas se você entrar na Cidade de Deus, vai ver que tem muita gente procurando o melhor pra si. Tem muita gente estudando, fazendo faculdade, tem atletas. A CDD também é um ninho de artistas, coisas que muita gente de fora não sabe."
Convivendo diariamente na favela, Will conta que adquiriu diversos aprendizados que leva até hoje pra vida.

"Ser humanitário, solidário. Ajudar o próximo. Porque tem muita gente que precisa. Não adianta você olhar só pra você e esquecer do próximo. É igual aquele ditado: 'fazer o bem sem olhar a quem'. Mesmo sendo uma comunidade carente, todo mundo ajuda um pouquinho o outro", disse ele, listando algumas carências do local.

"A comunidade carece de muita coisa. Obras de saneamento básico pra tratar do esgoto e da água. A luz deveria ser mais em conta também, porque tem morador que não tem trabalho com salário fixo", opinou.

Mantendo o Bonde do Vinho na ativa há 23 anos, William contou que a ideia surgiu através de uma gincana na CDD.

"O Bonde do Vinho surgiu em 1999, quando um amigo nosso, que gostava muita da bebida, inventou o nome. O nosso grupo tinha mais de 40 pessoas, mas era um grupo pra brincar em uma gincana na Cidade de Deus, na Escola de Samba Coroado. Então, tinha essa galera toda curtindo, zoando e tomando um vinhozinho. Só que pra cantar e dançar, o DJ Duda, um amigo nosso que produzia as músicas lá, me deu uma ideia: 'Tá na hora de ganhar um dinheiro com a música. A música de vocês quando toca, todo mundo gosta'. Aí eu perguntei: 'Como a gente faz?'. Ele falou que a gente ia produzindo e tentaria distribuir as músicas, mas explicou que a gente precisava de dançarinos. Aí tinha eu e o outro vocalista, o Carlos Alex, vulgo Leco, que junto comigo iniciou esse projeto, mas hoje não faz mais parte do grupo por questões pessoais. Mas o Bonde do Vinho surgiu assim. Eu chamei três meninos pra dançarem com a gente aí ficaram, Anselmo, Jairo e Robson como dançarinos, Leco e eu como vocalistas."

O sucesso não demorou a chegar. Logo no ano seguinte, em 2000, o Bonde do Vinho lançou o CD Só Tem Moleque Bom, com 14 faixas, que fizeram o grupo "explodir" de vez.

"Em 2000 lançamos o CD Só Tem Moleque Bom, porque a música I Feel Vinho já tava estourada em todo o Brasil e até fora. Ter essa sensação de sucesso, de você tá ali cantando, dançando e tá todo mundo cantando a sua música. Isso não tem preço. Não demorou muito pro sucesso vir. Em 1999 a gente ensaiava na laje, não ligávamos pra nada. A gente tava curtindo o momento. Mas em 2000 a gente viu que tava ganhando dinheiro com isso. Fazendo o que gostava, com o dom que Deus deu pra gente. Quando eu vejo uma pessoa cantando a nossa música, eu penso nisso. É uma coisa que até hoje eu não consigo explicar."
O cantor explica que o grupo não teve dificuldade em lidar com o sucesso, já que isso era um sonho de todos.

"Lidar com o sucesso foi uma coisa natural pra gente. A gente gostava muito das pessoas chamarem a gente pra tirar foto, quando pediam pra gente dar uma palinha de alguma música ou assinar uma camisa. Isso aí não tem preço."

William guarda com carinho diversos momentos marcantes que viveu no auge do grupo, contando dois exemplos que o marcaram.

"Foi um dos primeiros shows grandes que o Bonde do Vinho foi fazer. Foi pra Rádio Cidade, em Porto Alegre, pra 35 mil pessoas. Foi uma coisa de louco. Conhecemos outros artistas renomados. Foi top demais! Quando subimos no palco e cantamos a música, a emoção veio na hora. A lágrima desceu e ao mesmo tempo a gente tinha que continuar a cantar e dançar (risos). A outra foi quando a gente começou a viajar. Pega avião aqui, desce ali e faz escala. Muita coisa boa viajando pra fora do Brasil. Fomos pra Alemanha, Itália e Angola. E o pessoal cantando a música, isso que eu gostava mais. Eu pensava que a gente ia chegar nesses lugares e ninguém saberia cantar as músicas, mas não. Todo mundo cantava."

Apesar de todo o sucesso com o álbum de estreia, o Bonde do Vinho só lançou mais um CD.

Nós lançamos dois álbuns. Só Tem Moleque Bom, em 2000. E em 2002 nós lançamos um álbum comemorativo, de forma independente. O álbum se chamava "1000 Shows ao Vivo". Foi pra comemorar o milésimo show do Bonde do Vinho. É um CD que todo mundo procura, mas infelizmente não tivemos verba pra por ele em muita quantidade na pista. Porque se a gente põe, acho que cada casa de hoje ia ter um desse. Ficou muito bom. Todo mundo cantou as 12 músicas que tem no CD."

Remanescente da formação antiga, Will explica o que fez com que os outros integrantes deixassem o grupo.

"Na formação antiga, o grupo tinha cinco integrantes. O pessoal saiu do grupo mais pela vida pessoal deles. Devido ao mercado ficar mais competitivo, queriam descobrir e fazer outras coisas. Mas foi tudo conversado. O primeiro a sair foi o Jairo, que é pintor de autos e saiu pra exercer a profissão dele. O segundo foi o Robson, que hoje em dia é profissional de drywall. O último foi o Anselmo, que também trabalha na mesma área e quis sair pra cuidar da família. Porque nesse ramo da música você vê pouco a família. A partir de 2005, ano a ano foi saindo um por um. Eles alegaram que não dava mais pra eles ficarem dançando. Já o Leco, o outro vocalista, ele realmente se afastou por problemas pessoais. Ele foi o último a sair. Saiu em 2019."

Mesmo com todo o sucesso, o grupo ficou distante dos holofotes por muito tempo. William explica os motivos.

"Foram questões financeiras, falta de um investimento grande. As pessoas falavam que iam investir e sumiam. Tive uma três decepções assim. Essas questões pararam o grupo um pouco. Eu já tava quase desistindo de continuar. Foi quando algumas pessoas que trabalharam comigo, e em reuniões falaram que tinha gente interessada em mim e no Bonde. Aí eu já pensei nos dançarinos, procurando gente nova pra botar. E isso foi me animando a voltar com tudo."

Vendo que a possibilidade de um retorno seria bem vista, William quis manter as raízes do grupo, e buscou novos integrantes na Cidade de Deus, justamente onde tudo começou.

Tinha uns meninos na Cidade de Deus, que eles já dançaram e já participaram de vários grupos. Já dançaram de freelancer nos Hawaianos, no Bonde do Tigrão, que são bem conhecidos, e também tinha um grupo de dança na comunidade chamado Os Príncipes. Eles tavam tentando e nunca iam. Não sei se foi problema financeiro ou falta de apoio. Mas eu via que os moleques tinham um potencial bom, e chamei eles pra dançarem comigo. Vieram com o maior orgulho. Disseram: "Vai ser uma honra dançar com vocês. Meu sonho sendo realizado." E aí já viu, né? Juntou o útil com agradável, porque eles não deixavam eu desistir. Vieram com ideias novas, abraçaram a causa, e tão comigo até hoje.
Com mais de duas décadas acompanhando as transformações do funk, William opinou sobre as diferenças do gênero de hoje, com o que se fazia antigamente.

"Sempre tem as pegadinhas. É funk com pagode, com forro, com tudo hoje. Então, a gente tem que tá sempre se atualizando. Mas a diferença, na verdade, eu vou falar do bom, que é a dança. Nós sempre puxamos pra esse lado. E agora, juntando com o TikTok, a dancinha tá mandando no funk. Não vejo muitas diferenças. As músicas são dançantes e coreografadas. Pode ter na letra. Que hoje em dia a gente se preocupa mais em coreografar as letras junto com a música. Aí o pessoal escuta e endoida."

Falando sobre os sucessos das dancinhas, uma marca registrada do grupo, William contou que o grupo pretende aproveitar esse momento impulsionado pelo TikTok.

"As dancinhas deram um "boom" muito bom no funk. O TikTok revolucionou o funk de uma tal maneira, que até quem é todo duro quer dançar um pouquinho (risos). E indo nessa vibe do TikTok, a gente tá fazendo as músicas agora voltadas pra isso. Inclusive, tá vindo uma música nova nossa aí, chamada "Baladinha", que já vai sair com clipe, que o refrão dela é todo TikTok. Essa vai ser um chiclete na boca do povo. O que mais vai aparecer é o pessoal tentando fazer a coreografia do refrão, porque é muito rápido. Mas o pessoal gosta disso. A gente tá se policiando pra fazer coisas diferentes, mas sem perder a nossa essência."

Além de Baladinha, o Bonde do Vinho lançará outras novas músicas muito em breve.

A outra é a Desce Sobe 2, porque a gente tinha a primeira, e a última música a gente vai lançar, ainda estamos na dúvida, porque tem duas opções. Uma se chama "Poderoso Chefão", que eu tô até lapidando ela. E a outra chama "Favela", que fala sobre a comunidade. É uma história legal de crianças que querem ser alguém na vida, que mostra muito a realidade. Fala sobre projetos sociais, e pede pra governo olhar melhor pra comunidade."

Will também contou em primeira mão, que as novas músicas terão clipes pra galera aprender as dancinhas

"Vai ter clipe dessas músicas novas, e a gente vai fazer também clipe de I Feel Vinho e de Desce Sobe. I Feel tem um clipe muito antigo, aí a gente quer fazer algo mais atualizado. Com as batidas um pouco diferentes, mas sem sair da nossa origem. Mas podem esperar do Bonde do Vinho mais cinco ou quatro clipes nossos que a galera vai gostar", prometeu.

Animado com a nova fase do grupo, Will contou como tem sido a recepção do público ao retorno do Bonde do Vinho.

"Esse retorno nosso tá sendo uma coisa de louco. Eu não tava esperando o pessoal gostar tanto da nossa volta. Um videozinho que a gente lança já dá várias visualizações. Algo que não tava acontecendo antes. Tudo isso devido a um trabalho sério, de um escritório que tá com a gente. Hoje a gente canta em aniversários, em casamentos, botamos as pessoas pra se reconciliarem no palco. Isso é muito gratificante. Cantamos em festa de 15 anos, bares, morrão, asfalto. Não temos preconceito. Onde estiverem contratando, o Bonde vai cantar."
Por fim, Will compartilhou algumas novidades que o Bonde do Vinho colocará na pista em breve, prometendo agitar as festas por todo o Brasil.

"Bastantes novidades. A gente tem pesquisado muito fora do Brasil e dentro também, o que o povo gosta de escutar. Vocês sabem que o lema do Bonde do Vinho é coreografia. Então vocês vão ter músicas coreografadas e dançantes. Teremos coisas novas no palco, como teatro, que é uma coisa que eu já tenho pesquisado faz tempo pra fazer, e que o povo gosta, vai se divertir. Ou seja, as noites do mundão vão ser mais alegres com o Bonde do Vinho. Vai ser gratificante tanto pra gente, quanto pro público. Vem muita alegria por aí."