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Milícia comandada por Ecko usa proibidões para disputas de territórios e ameaças

Funks da facção também citam aliança de milicianos com o tráfico do Terceiro Comando Puro. Em Madureira, fusão é chamada de 'TClícia'

Baile da Romênia, na Vila Aliança, Zona Oeste. Área dominada pelo TCP toca os proibidões da milícia CL, mostrando apoio mútuo entre facções
Baile da Romênia, na Vila Aliança, Zona Oeste. Área dominada pelo TCP toca os proibidões da milícia CL, mostrando apoio mútuo entre facções -
Com a batida do funk e rajadas de tiros ao fundo, a letra da música fala: "Igual à máfia italiana, a nossa fama se espalhou. É Tudo 5, morador". Outra, diz: "Faz o C, faz o L. Essa é a tropa do CL". Esses são os chamados proibidões da milícia que, assim como o tráfico, faz uso do estilo musical para homenagear os líderes da facção criminosa, ameaçar inimigos e mostrar poderio bélico.

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Francisco Anderson da Silva Costa, o PQD, é o número 2 na hierarquia do miliciano Ecko Reprodução
Ecko, chefe da maior milícia do estado do Rio, continua foragido Divulgação / Polícia Civil
Baile da Romênia, na Vila Aliança, Zona Oeste. Área dominada pelo TCP toca os proibidões da milícia CL, mostrando apoio mútuo entre facções Reprodução redes sociais
Em oposição ao Comando Vermelho, que tem como slogan o "Tudo 2", a milícia comandada por Wellington Oliveira, conhecido como Ecko ou 220, se apelida de "Tudo 5". Já CL é em referência a Carlos Alexandre Braga, o Carlinhos Três Pontes, irmão de Ecko, morto em 2017.
Os funks são tocados em bailes nas áreas dominadas pela milícia CL e pelos traficantes do Terceiro Comando Puro, como no baile da Romênia, na Vila Aliança, Zona Oeste. A união entre os dois grupos já é conhecida da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco).
“Cada vez mais a milícia se iguala ao tráfico. Em Madureira, a ligação é tão forte com o TCP, que eles se intitulam ‘União 5.3 ou TClícia, fusão de TCP com milícia. Em outras áreas, a maioria dos soldados da milícia é oriunda do tráfico de drogas, principalmente de Santa Cruz”, afirmou o delegado William Pena, titular da especializada.
As músicas também abordam a disputa territorial - tanto das áreas já invadidas, quanto as que eles pretendem controlar, como a Cidade de Deus, reduto do Comando Vermelho.
Ao mesmo tempo, tentam motivar os integrantes da facção, ressaltando a resistência à prisão de Três Pontes, morto em confronto com a polícia. É o que se refere o trecho “Vamos honrar o sacrifício do Paizão”. E, em outros, angariar a simpatia dos moradores.
Proibidão: identificação territorial
Para o doutor em Antropologia Social Dennis Moraes, autor da tese 'Funk Proibidão: música e poder nas favelas cariocas’, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o fenômeno deve ter sua genuinidade avaliada. Para ele, a definição de proibidão é o funk que trata as “sociabilidades e práticas em torno da noção de bandido”, e carrega consigo a espontaneidade.
"O proibidão surge na década de 1990, com a juventude das periferias assumindo símbolos de pertencimento e orgulho territorial. Nas áreas do Comando Vermelho, essa juventude, que sofre com a violência e abandono do Estado, se identifica com o lema 'Paz, Justiça e Liberdade' como um grito para um futuro melhor", explicou, acrescentando que os proibidões despertam nesses jovens  "uma identidade ao estilo de time de futebol".
"Já com as UPPs os proibidões se voltam contra a ocupação policial, por exemplo. Agora, o domínio da milícia em algumas áreas é algo novo, será que houve tempo para esse jovem criar essa sintonia de pertencimento? Tem que se avaliar se esses proibidões da milícia foram criações espontâneas. Será que quem fez as letras quis escrever ou recebeu para isso?”, questionou o pesquisador. 
Milicianos citados em funks são procurados pela polícia
Entre os nomes citados nos funks da Milícia CL estão os dos criminosos Francisco Anderson da Silva Costa, o PQD; Danilo Dias Lima, o Tandera; Ronaldo Marinho Costa, o Secretário; e Emerson Benedito, o Macumba.
De acordo com o delegado William Pena, da Draco, a milícia é considerada a maior do estado pelo domínio territorial. “A milícia do Ecko controla prioritariamente a região de Santa Cruz e Campo Grande. O PQD é o segundo na hierarquia”, disse. 
Já Secretário é acusado de, em maio, matar o policial Rodrigo Guandagno dos Santos, lotado no Departamento Geral de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado e à Lavagem de Dinheiro. Ele foi morto enquanto investigava o braço financeiro do grupo. 
Ainda no Rio, há outros grupos de milicianos, também aliados a traficantes. “Na região de Campinho e Praça Seca tem uma estrutura chefiada por dois irmãos, que são aliados ao traficante Lacoste, Wallace de Brito Trindade, de Madureira”, informou Pena.
Já a Baixada Fluminense, além de ter um braço do Ecko comandado por Tandera, em Nova Iguaçu; e Macumba, em Itaguaí, há diferentes chefes de milícias em Belford Roxo e Duque de Caxias. “Podemos falar que são cinco grandes grupos de milicianos, com influências em vários bairros, e outros grupos menores”, explicou o delegado.
A Polícia Civil tem feito frequentes operações que resultaram em prisões desse tipo de criminosos, que cobram taxas de moradores por suposta segurança. Um deles foi Felipe Ferreira Carolino, o Zulu, conhecido como ‘General das Guerras’. Ele era o responsável por articular invasões e é citado em inúmeros proibidões, que pedem sua liberdade. Em 2019 foram presos 577 milicianos, sendo 119 na Baixada Fluminense.