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Kmila CDD fala sobre origem, promete novo EP solo e exalta Cidade de Deus: ‘Não é só violência, tem o lado bom também’

Irmã de MV Bill, com quem gravou recentemente "Briga de Casal (Estilo Vagabundo 5)", cantora é uma das mulheres pioneiras no rap nacional

Cria da Cidade de Deus, Kmila CDD é uma das mulheres pioneiras no rap nacional
Cria da Cidade de Deus, Kmila CDD é uma das mulheres pioneiras no rap nacional -
Mãe, mulher negra, de favela e voz feminina pioneira no rap nacional. Com muito orgulho de suas bandeiras e com o apoio de seu irmão MV Bill, Kamila Barbosa conquistou seu espaço na música, onde é conhecida por todos como Kmila CDD, uma referência à comunidade Cidade de Deus, lugar onde nasceu e foi criada. Em entrevista ao MEIA HORA, a rapper de 39 anos relembrou sua trajetória de vida, contando em primeira mão que lançará em 2022 seu segundo EP solo.

"Carrego a Cidade de Deus no meu nome artístico com muito orgulho. Porque além de ter nascido na favela e ter vivido muita coisa lá dentro, as pessoas que me conheceram, tanto de dentro quanto de fora da favela, quando me viam falavam: 'E aí CDD'. E eu gostava muito disso, de me lembrar sempre do lugar de onde eu vim. Então eu abracei esse nome e carrego com satisfação para os lugares do mundo onde eu passo", explicou.

Mãe da pequena Maria Eduarda, de 5 anos, Kmila contou que apesar de não morar mais na Cidade de Deus, mantém relações fortes com o local, e tenta passar para sua filha os aprendizados adquiridos nos tempos em que viveu lá.

"Meus pais, parentes e amigos de infância moram na CDD. É um lugar que eu frequento bastante e que me ensinou muito a viver. Lá eu aprendi o que é certo e o que é errado. E todo aprendizado de vida que eu carrego hoje no meu nome, na minha história, tento passar pra minha filha. Falar da Cidade de Deus pra mim é motivo de muito orgulho. CDD não é só violência, tem o lado bom também. As dificuldades são que nós não temos as melhores escolas, os melhores postos de saúde, as melhores condições urbanas para se viver. Mas tem teatro, tem aula de balé e escolinha de futebol para as crianças. As coisas poderiam ser ainda melhores se tivesse uma ajuda do poder público, porque as coisas boas que acontecem na Cidade de Deus são feitas por moradores. Somos nós por nós."
Kmila CDD nas gravações do clipe "Rapstência" - Divulgação
Com muito tempo de estrada, a rapper gravou seu primeiro trabalho em 1999, quando participou da faixa "Pare de Babar", uma das músicas do álbum de estreia do seu irmão, intitulado "Traficando Informação". A cantora lembrou da importância de MV Bill nos seus primeiros passos na música.

"O Bill fazia um evento na Cidade de Deus chamado 'CDD SOS Consciência'. Eu tinha uns 13 anos de idade. Ainda não escrevia, não fazia as minhas letras. E foi nessa época que eu subi pela primeira vez no palco, justamente nesse evento promovido pelo meu irmão dentro de um CIEP (Centros Integrados de Educação Pública). A diretora do colégio cedia o espaço e eles faziam um evento. A galera do rap underground, porque nessa época ninguém sabia o que era rap direito. Eu me vestia com roupas masculinas, porque a minha referência maior no rap era meu irmão. Desde pequeninha eu queria falar de rap e dessas mazelas. Foi uma experiência que mudou minha vida. Até as pessoas da Cidade de Deus ficavam surpreendidas comigo, por ser tão criança e tá lá no meio me posicionando”, lembrou ela, citando Leci Brandão e Sandra de Sá como duas de suas referências.

"Minha mãe escutava e eu gostava do jeito que elas cantavam. Ouvia o que elas falavam nas letras delas, que eram letras bem rap", contou ela, aproveitando também para explicar como surgiu o seu amor pelo gênero.

"A casa dos meus pais sempre foi uma casa que tocava muita música. Agora, o meu gosto musical pelo rap veio através do meu irmão. Lá em casa era eu, ele, uma irmã e minha mãe. Ele ouvia muito rap, e a pessoa que se interessava em ouvir junto com ele era eu, apesar de ser mais nova. Ficava ali perto, me amarrava nas batidas, fazia perguntas, e o Bill com todo o carinho sempre me explicava. Foi onde eu descobri o meu amor pelo rap", contou.

Tendo participado de todos os álbuns gravados por MV Bill, emplacando diversos sucessos em parceria com ele, como "O bonde não para" e "Rapstência", Kmila disse que jamais se sentiu incomodada ou desvalorizada por ter seu trabalho ligado ao do irmão.

"Eu conheci o rap através dele, comecei a cantar com ele. Então quando tem essa ligação com o meu irmão, pra mim é motivo de muito orgulho. Meu irmão é uma referência muito grande pra mim. Não só como rapper, mas como pai também. Meu pai saiu de casa muito cedo, então o Bill foi a figura masculina e paterna que eu tinha na minha casa. Eu tenho um puta orgulho. Quando eu falo do meu irmão, chego a me emocionar", contou ela.
Kmila CDD participou de todos os álbuns laçados por MV Bill - Foto: Douglas Jacó
Falando em sucessos gravados com MV Bill, a música "Estilo Vagabundo 3", lançada há oito anos, recentemente viralizou no TikTok, assim como outras faixas dessa série, que começou em 2006, quando os irmãos deram vida pela primeira vez a um casal que vive entre tapas e beijos. Kmila se disse feliz por ver seu trabalho sendo consumido por um público novo através do aplicativo.

"Essa parada do TikTok tá sendo muito legal. Porque a maioria do público que conhece a nossa música "Estilo Vagabundo" por ali, que faz a dublagem, é um público que não gosta de rap. Tem gente que não nos conhecia e passou a conhecer através do TikTok. Eu recebo muitas mensagens de pessoas que conhecem o meu trabalho através da plataforma. Então é muito legal. Tem crianças, pessoas jovens e até idosos que me mandam os vídeos, me marcam. A gente tem que transitar por todos os espaços e o Tik Tok criou esse novo caminho, o que me deixa muito feliz.”

Falando em "Estilo Vagabundo", a parte 5, intitulada "Briga de Casal", foi lançada no último dia 15. Kmila contou detalhes sobre o processo de gravação da música, que contou com a produção de Papatinho. A rapper confirmou também a data de lançamento do clipe.

"Foi muito bom ter feito a parte cinco. Na parte um, é um casal brigando mesmo. Na parte dois, eles tentam ali uma reconciliação e assim por diante. Agora na parte cinco, é um casal mais maduro, a mina já tá de saco cheio, não quer mais brigar por aquilo ali. Eles tão mais trocando uma ideia mesmo. E ter gravado esse som com o Papatinho foi uma honra. É um produtor que eu admiro há bastante tempo. Tá com o Bill em mais essa "DR" foi muito legal. Me diverti muito. Gravamos um videoclipe que vai ser lançado entre o fim de janeiro e o início de fevereiro. Espero que vocês gostem", disse ela.
Kmila CDD gravou recentemente com MV Billa faixa "Briga de Casal (Estilo Vagabundo 5)", que foi produzida por Papatinho - Foto: Douglas Jacó

Carreira solo, bandeiras e novidades

Em 2017, Kmila lançou o seu primeiro EP solo, o "Preta Cabulosa", que foi um marco em sua carreira. No álbum, ela utiliza as faixas para abordar temáticas fortes enfrentadas pelas mulheres, como tentativa de estupro (A Faca), até família e maternidade (Ciranda da Vida).

"As pessoas no show do Bill sempre me cobravam muito: ‘Lança o seu disco, lança o seu trabalho solo’. Mas antes eu achava que não era o meu momento, eu não estava com vontade de fazer um ep. Aí chegou nesse período que eu já tinha tido a minha filha, e me deu vontade. Eu demorei bastante pra fazer todas as letras, porque eu já tava com bebê pequeno. Fui gravar num estúdio em Niterói e levei toda a minha família. Fiquei uns três dias no estúdio gravando, então tem um significado enorme pra mim. De amor, de comprometimento, de rap e de gratidão, por ele ter sido tão bem recebido pelo meu público, e até por quem não conhecia. Em breve vou lançar outro!" prometeu ela.

A rapper também vibrou com o novo momento do rap, onde as mulheres têm ganhado cada vez mais força.

"Quando eu comecei a fazer rap, até tinham mulheres, mas elas não tinham a visibilidade que tem hoje. Eu conhecia várias minas que faziam rap, mas elas não tinham vez. Hoje, as mulheres estão mais empoderadas, tomando de assalto pra mostrar que elas também são capazes. Então ver o rap crescendo e mulheres compondo esse grupo, só me deixa feliz. E saber que tem outras mulheres mais novas do que eu que se espelham em mim, que me tem como referência, isso é uma satisfação sem tamanho”, disse ela, ressaltando ainda a importância de levantar bandeiras através da música.

"Ser mãe, ser mulher preta e poder levantar essas bandeiras no meu trabalho, é de extrema importância. Porque tem muitas mulheres que não tem voz, que não tem como se expressar. Então através de mim, eu percebo que elas se sentem representadas e fico feliz de saber que minha voz ecoa, que chega em todos os lugares", analisou.
Kmila CDD gravou diversas parcerias de sucesso com seu irmão, o rapper MV Bill - Foto: Douglas Jacó
Por fim, Kmila CDD prometeu aos seus fãs um 2022 repleto de novidades.

"Tem muita coisa boa vindo por aí. Várias participações, algumas já estão até prontas, mas não deu tempo de lançar nessa correria de final de ano. Estou produzindo um novo EP, que já tá quentinho. Esse vai demorar um pouquinho, mas nesse ano novo vai tá aí. Um trabalho lindo, feito com muito carinho pra vocês", prometeu.












Cria da Cidade de Deus, Kmila CDD é uma das mulheres pioneiras no rap nacional Douglas Jacó
Kmila CDD gravou diversas parcerias de sucesso com seu irmão, o rapper MV Bill Foto: Douglas Jacó
Kmila CDD disse que lançará em 2022 o seu segundo EP solo Foto: Douglas Jacó
Kmila CDD participou de todos os álbuns laçados por MV Bill Foto: Douglas Jacó
Kmila CDD gravou recentemente com MV Billa faixa "Briga de Casal (Estilo Vagabundo 5)", que foi produzida por Papatinho Foto: Douglas Jacó
Kmila CDD Divulgação
Kmila CDD nas gravações do clipe "Rapstência" Divulgação

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